A equação custo-benefício

* Crônica publicada no site JUS BRASIL em novembro/2008

A equação custo-benefício é quase uma norma sagrada para os empresários que sabem resumir nela a viabilidade de qualquer empreendimento ou, mudando o jogo de palavras é a equação que estabelece se uma empresa vai operar com lucros ou se vai trabalhar com prejuízos -"no vermelho" -como se diz popularmente.

Há muitos anos filio-me àqueles que pensam ser o desprezo da equação custo-benefício um dos graves problemas que compõem a chamada "ineficiência" do setor público no Brasil, valendo isso para todas as esferas e para os três Poderes da Nação, inclusive o Judiciário, ao qual vamos nos deter neste artigo , por se tratar da nossa área de interesse e ação.

O artigo "Quanto Custa a Justiça Nacional", assinado por Joaquim Falcão (Espaço Vital de 27.10.08) celebra a necessidade de abordagem econômica da Justiça, e aí necessariamente insere-se como ponto de incisão a resistência dos que conduzem a gestão de nosso Judiciário à formulação dessa equação, sobretudo porque cada vez que se tenta aprofundar a discussão, ela é barrada com argumentos que, diga-se de passagem, do ponto de vista técnico-jurídico são respeitáveis, mas que acabam ceifando a matéria de fundo.

Para apimentar o debate, conto um fato que seu deu, há alguns anos, quando fui solicitado por um juiz para acompanhar um cidadão numa audiência por conta da AJG, já que a comarca possuía apenas um defensor público e ambas as partes eram pobres -situação aliás muito comum nas pequenas cidades -e como sempre a Advocacia presta essa colaboração tão pouco reconhecida. Era uma ação de alimentos e ficava difícil estabelecer quem era mais miserável: autora e requerido ficavam abaixo da linha da pobreza.

A discussão parecia interminável e por diversas ocasiões o Juízo teve de interferir para manter a calma e a regularidade dos trabalhos, sendo que após muito tempo e apartes dos advogados e do Ministério Público chegou-se a um acordo. O requerido pagaria um percentual do salário mínimo como pensão e deveria pagar uma parcela no ato. O miserável levou a mão ao bolso e puxou um invólucro cheio de moedas e escassas notas de cinco reais - a maioria mesmo em cédulas de um real. A cena ficou plasmada entre o trágico e o cômico.

Concluída a solenidade, lembro que ficaram na sala somente os operadores do Direito e foi suscitada a questão da equação custo-benefício . Quanto custara ao Estado aquele processo se, somadas as remunerações de todos os operadores envolvidos, labor de cartório e oficiais de justiça?

Ninguém teve a coragem de duvidar que o custo da solução foi infinitamente maior do que o custo do problema. Mas nem o Ministério Público, nem o Juízo admitiram o problema, pois sustentaram que se tratava de Direito de Família e, como tal, não havia outra forma de resolver o impasse: era só aquela. Ponto final !

Na barreira do respeito à letra fria da lei e de uma exegese positivista do ordenamento jurídico, não se discutem novas fórmulas para uma necessária triagem das causas que interessam ao efetivo equilíbrio da sociedade e aquelas que apenas se acumulam sem que o atual modelo consiga dar-lhes o devido atendimento. A criação de novas instâncias como, por exemplo, um Judiciário municipal ao qual se transfeririam todas as "pequenas causas" , incluindo institutos como Direito Tributário, Direito de Família e Direito Penal , já parece ter passado da hora, ou - se preferir o leitor - desafiam a equação custo-benefício.

Como curioso e hilário nessa história, ficou a inexorável conclusão de que o único direito "relativo" naquele ato foi o do advogado que trabalhou de graça. Todos os demais romperam a equação custo-benefício e isto repete-se em centenas ou milhares de processos, diariamente. Mesmo no caso dos precatórios, os advogados ainda que "contemplados" com a sucumbência, o Estado não paga; ou seja, consagra-se um círculo vicioso que só faz ratificar a negação da equação custo-benefício , que parece só ser quebrada quando se trata de não reconhecer os direitos da Advocacia.