Abraão Lincoln e a meia-idade
Segundo ano de Direito, após incursões nas faculdades de Economia e de Arquitetura. Quarenta e cinco anos e uma súbita crise da meia-idade.
Na sala de aula, comento com a Renata: “Quando me formar, estarei com quase cinquenta anos: no fim da vida! Que chances terei no mercado de trabalho?”
Ela nada responde. Cinco minutos depois, apenas me entrega um papelucho, guardado até hoje como um quase-amuleto:
“Abraão Lincoln
- faliu aos 22;
- depressão aos 23;
- perdeu as eleições aos 26;
- perdeu as eleições aos 30;
- ficou doente aos 38;
- perdeu a mulher que ficou louca aos 40;
- perdeu as eleições aos 50;
- perdeu as eleições aos 58;
- virou Presidente da República”.
Lincoln não é mais um presidente da história dos Estados Unidos. É um marco. Sua biografia destaca seus erros (muitos e grandes) e suas vitórias. Foi um autodidata que aprendeu com os próprios fracassos e sua história – ou histórias de sua vida – transformou-se em lenda.
Hoje, concluído o curso, encaro o bilhetinho amarelado, já encardido, e me vejo recomeçando, ressurgida das antigas brasas apagadas, que já foram fogo intenso.
Não sou economista nem arquiteta. Mas bacharelei em Direito. As limitações impostas pela luta pela sobrevivência – afinal, é preciso comer, morar, comprar os livros e pagar a faculdade, além de cuidar de uma família – implicaram em tempo menor para a dedicação aos estudos.
No entanto, dei o melhor de mim. Cada pesquisa, cada novo curso ou palestra, era uma nova oportunidade de crescimento. Cada novo trabalho proposto, uma luz.
O tempo é um grande professor, ainda que escasso para todos os nossos propósitos. Gostaria de trabalhar mais, estudar mais, conviver mais com minha família.
Mas se não é possível o que desejo, ao menos pude equilibrar o que tenho: uma família maravilhosa, um emprego que me proporciona pequenos prazeres e desafios e um aproveitamento escolar muito bom.
Transmitida a mensagem, para que outros dela aproveitem, guardo aquelas palavras, no papelzinho velho e manchado, para que ele também renasça, quando redescoberto, daqui a alguns anos, a proporcionar novo alento. A mim ou a quem quer que o encontre.
Maria da Glória Perez Delgado Sanches
Membro Correspondente da ACLAC – Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo, RJ.
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