O medo pode ser uma arma!
Nada é mais agradável do que podermos contar com a companhia de amigos, e partilharmos nosso dia a dia...
Foi neste espírito de camaradagem que eu e uma amiga, nos dirigimos para a rodoviária de nossa cidade, já que ambas estávamos, naquela semana, sem carro. Nosso destino, São José dos Campos, onde tínhamos alguns assuntos a resolver.
Como fazia um bom tempo que por ali não andava, causou-me uma certa nostalgia, trazendo-me lembranças do tempo de estudante, quando freqüentávamos amiúde este lugar, e que foi palco de incontáveis histórias agradáveis de nossa mocidade.
Enquanto aguardava na fila para adquirirmos as passagens, refleti quanto tempo havia se passado e, para minha surpresa, o quanto nada estava mudado por lá... Uma rodoviária que permaneceu quase inalterada por uns trinta anos! Pensamento este, que me fez tomar consciência do fato de que a maioria das cidades do Vale, já conta com terminais bem mais modernos e adequados à época em que vivemos, e compatíveis ao crescimento da população...
Enfim, embarcamos animadas com nossas conversas, estas, que normalmente mantemos em momentos de descontração e que por si só nos divertem e alegram a alma...
Passamos uma tarde agradável, em que pudemos resolver tudo que nos propusemos, com pleno êxito, o que causou uma sensação de bem estar ao retornarmos para casa.
Tomamos o ônibus num ponto já na saída da cidade, e por conta disso, o encontramos lotado. Era hora do “rush” e precisamos usar toda nossa determinação para que nos colocássemos dentro da condução.
Fomos nos espremendo e tentando nos acomodar em algum cantinho, onde pudéssemos ser poupadas de tanto aperto e desconforto...
Mais uma vez a lembrança veio salpicar meus pensamentos, com a recordação dos tempos em que diariamente lutávamos por um espaço a fim de irmos para casa, embora cansados, invariavelmente alegres e fazendo brincadeiras a viagem toda...
A juventude tem uma singularidade encantadora, uma alegria natural e contagiante que, o simples fato de lembrá-la, mexe com todo nosso ser, trazendo de volta sentimentos que jamais se perderam, apenas foram esquecidos, no tumulto da maturidade...
Como sou baixinha, precisei fazer âncora ao lado de um banco, segurando em seu encosto; já minha amiga, bem mais alta, apoiava-se no suporte fixado no teto do ônibus.
Em dado momento, nos separamos. Acredito, que foi ela levada, involuntariamente, pelo movimento da massa de pessoas que tentava ocupar um espaço; que parecia não haver, lembrando-me da propriedade da matéria, que é clara: dois corpos não ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo!
Assim a viagem até nossa cidade transcorreu de certa forma aconchegante, pois nos sentíamos todos “abraçados” e “aquecidos” , naquela tarde agradável e com pouco sol, dentro de um ônibus com pouco espaço, para tanta gente............
Finalmente chegamos e descemos num ponto do General Carneiro, pois ainda desejávamos passar em alguns lugares.
Já na calçada, minha amiga apressou-se a relatar o que havia se passado com ela, no ônibus.
Estava ela tentando manter-se equilibrada em meio à confusão reinante, quando sentiu, por duas vezes, alguém a empurrando diretamente. Ao acomodar-se olhou para o braço e percebeu que seu relógio não estava no pulso.
Indignada, com a raiva de quem já foi assaltada por diversas vezes, e que não mais tolera ser oprimida, remeteu duas cotoveladas certeiras no homem que estava atrás dela, e, pela dor que sentiu no próprio braço, pode imaginar a dor que causou no seu.algoz. Ato contínuo virou-se para ele enfurecida e, com a autoridade outorgada pelo ultraje, ordenou que o homem em questão colocasse o relógio em sua bolsa...o que incontinente ele o fez.
Havia nela, ao relatar o ocorrido, uma alegria quase mórbida, por ter enfim, levado a melhor numa tentativa de roubo, .o que me fez sentir uma certa tristeza, observando aquela criatura tão sofrida com os males da época moderna...
Neste momento, minha amiga ao falar e gesticular percebe o relógio em seu pulso...talvez, quem sabe, houvesse se prendido por dentro, na manga da blusa...quiçá...
Rapidamente, com a feição surpresa, ela abre a bolsa, remexe e de lá tira um objeto.
Ambas, espantadas, contemplamos em sua mão...um relógio masculino!!!!!!!!!...
Priscila de Loureiro Coelho