Não se acostume com tudo.
Receber visitas de parentes e amigos geralmente é um prazer, digo geralmente, porque algumas vezes, apesar de gostarmos do visitante, nos sentimos incomodados. Uma pequena alteração da rotina, a principio, faz muito bem, porém se a visita se estender e for necessário um esforço maior que exija sair da nossa zona de conforto, torna-se um problema.
A situação agiganta-se quando se faz necessário adaptar acomodações para a hospedagem, como: transformar o sofá em cama, o escritório em quarto de hóspede ou outras coisas do tipo, mas nada pior que ter que desencravar um velho colchão e estendê-lo na sala.
Lembrei-me dessas situações por ter recebido a visita de alguns familiares neste final de semana. Ocorreu tudo bem, nada que se encaixe nas situações mencionadas. Felizmente foi possível acomodar todos sem transtornos e ainda desfrutar da excelente companhia, como a do meu sobrinho de três anos que, apesar de criança, atraiu a atenção de todos pelas suas atitudes e questionamentos inocentes.
Questionamentos que me trouxeram lembranças dos bons tempos de criança, da vida simples do interior, mas nada de nostálgico, afinal, sei muito bem que a minha vida, hoje, é fruto das escolhas passadas, assim como meu caráter tem raízes fincadas nos valores da vivência familiar simples e amorosa da vida na zona rural. No entanto, foram os inocentes questionamentos que me fizeram aprender e relembrar muitas lições importantes para a vida adulta. Perguntas simples que eu respondia sem grandes argumentos, ou até sem argumento algum, bastava um simples; “porque aqui na cidade é assim”. Já que se elas fossem respondidas com maior seriedade e profundidade me levaria a constatar grandes incoerências, injustiças e tantas outras mazelas sociais.
Responder-lhe - “por que as pessoas viviam em caixinhas uma encima da outra?” - Referia-se aos prédios com dezenas de apartamentos. Uma pergunta que, por mais precisa e ampla que fosse a resposta não exigia grande esforço, mas, como responder na mesma precisão e extensão às indagações, do tipo: Por qual razão as crianças pedem dinheiro na rua? Elas não têm mãe? Moram aonde? Ele vai comer o lixo?
Esses e muitos outros questionamentos, típicos de uma criança que conhecia pela primeira vez uma cidade grande eram fruto da observação de cenas surpreendentes não apenas para ela, mas também para a mãe e a avó. Observavam essas e outras cenas com um sentimento de dó, ou melhor, com “dor no coração”, como diziam. Em alguns momentos do passeio, passei a evitar locais onde estas cenas pudessem ser vistas, pois me sentia constrangido em não sentir o mesmo sentimento de pena que meus familiares expressavam. Sei que essa não foi a melhor atitude, pelo contrário, é esse tipo de comportamento que faz com que esses problemas sejam empurrados para debaixo do tapete e jamais solucionados.
As desigualdades sociais que chocaram, especialmente meus visitantes, também são vistas pela grande maioria dos moradores das grandes cidades, mas apenas como parte da paisagem urbana, porque estão acostumados com a situação, pois com o tempo passaram a aceitá-la, e, portanto, não sentem qualquer responsabilidade ou obrigação de solucioná-las. Por outro lado, os cidadãos urbanos, comovem-se, e com razão, ao ver um animal sendo maltratado e dispensam todo o seu carinho e cuidados com os animais de estimação. No contraponto, muitos moradores do campo consideram um exagero essa dedicação com os animais de estimação; vêem com naturalidade maus tratos; abandono e até mesmo o abate de animais, uma vez que estes são fatos que fazem parte do contexto em que vivem.
Questões simples ou complexas são vistas de maneira diferente por cada indivíduo, pelo simples fato de terem se acostumado. Uma vez fixada na mente, seja qual for à situação dificilmente a percebemos e conseqüentemente a aceitamos, independente de ser certa ou errada, boa ou ruim, enfim, perdemos o “senso” de valor.
O importante é mantermos a mente alerta, pois se acostumarmos, facilmente encurtaremos a visão e logo estaremos aceitando tudo, e sem perceber, restringimo-nos de viver plenamente. Além de desperdiçarmos a oportunidade de crescermos, nos acomodamos e fechamos os olhos para problemas que ameaçam a evolução humana. Assim como receber vistas queridas, a princípio, sempre algo muito agradável, mas ao exigir adaptações e mudanças de rotina que ameacem a nossa zona de conforto, optamos por nos privarmos de conviver com o visitante.
A minha visita já se foi, mas deixaram muitas lições, entre as quais, a de não me acostumar com o que deveria ser inaceitável. Boa semana.
Receber visitas de parentes e amigos geralmente é um prazer, digo geralmente, porque algumas vezes, apesar de gostarmos do visitante, nos sentimos incomodados. Uma pequena alteração da rotina, a principio, faz muito bem, porém se a visita se estender e for necessário um esforço maior que exija sair da nossa zona de conforto, torna-se um problema.
A situação agiganta-se quando se faz necessário adaptar acomodações para a hospedagem, como: transformar o sofá em cama, o escritório em quarto de hóspede ou outras coisas do tipo, mas nada pior que ter que desencravar um velho colchão e estendê-lo na sala.
Lembrei-me dessas situações por ter recebido a visita de alguns familiares neste final de semana. Ocorreu tudo bem, nada que se encaixe nas situações mencionadas. Felizmente foi possível acomodar todos sem transtornos e ainda desfrutar da excelente companhia, como a do meu sobrinho de três anos que, apesar de criança, atraiu a atenção de todos pelas suas atitudes e questionamentos inocentes.
Questionamentos que me trouxeram lembranças dos bons tempos de criança, da vida simples do interior, mas nada de nostálgico, afinal, sei muito bem que a minha vida, hoje, é fruto das escolhas passadas, assim como meu caráter tem raízes fincadas nos valores da vivência familiar simples e amorosa da vida na zona rural. No entanto, foram os inocentes questionamentos que me fizeram aprender e relembrar muitas lições importantes para a vida adulta. Perguntas simples que eu respondia sem grandes argumentos, ou até sem argumento algum, bastava um simples; “porque aqui na cidade é assim”. Já que se elas fossem respondidas com maior seriedade e profundidade me levaria a constatar grandes incoerências, injustiças e tantas outras mazelas sociais.
Responder-lhe - “por que as pessoas viviam em caixinhas uma encima da outra?” - Referia-se aos prédios com dezenas de apartamentos. Uma pergunta que, por mais precisa e ampla que fosse a resposta não exigia grande esforço, mas, como responder na mesma precisão e extensão às indagações, do tipo: Por qual razão as crianças pedem dinheiro na rua? Elas não têm mãe? Moram aonde? Ele vai comer o lixo?
Esses e muitos outros questionamentos, típicos de uma criança que conhecia pela primeira vez uma cidade grande eram fruto da observação de cenas surpreendentes não apenas para ela, mas também para a mãe e a avó. Observavam essas e outras cenas com um sentimento de dó, ou melhor, com “dor no coração”, como diziam. Em alguns momentos do passeio, passei a evitar locais onde estas cenas pudessem ser vistas, pois me sentia constrangido em não sentir o mesmo sentimento de pena que meus familiares expressavam. Sei que essa não foi a melhor atitude, pelo contrário, é esse tipo de comportamento que faz com que esses problemas sejam empurrados para debaixo do tapete e jamais solucionados.
As desigualdades sociais que chocaram, especialmente meus visitantes, também são vistas pela grande maioria dos moradores das grandes cidades, mas apenas como parte da paisagem urbana, porque estão acostumados com a situação, pois com o tempo passaram a aceitá-la, e, portanto, não sentem qualquer responsabilidade ou obrigação de solucioná-las. Por outro lado, os cidadãos urbanos, comovem-se, e com razão, ao ver um animal sendo maltratado e dispensam todo o seu carinho e cuidados com os animais de estimação. No contraponto, muitos moradores do campo consideram um exagero essa dedicação com os animais de estimação; vêem com naturalidade maus tratos; abandono e até mesmo o abate de animais, uma vez que estes são fatos que fazem parte do contexto em que vivem.
Questões simples ou complexas são vistas de maneira diferente por cada indivíduo, pelo simples fato de terem se acostumado. Uma vez fixada na mente, seja qual for à situação dificilmente a percebemos e conseqüentemente a aceitamos, independente de ser certa ou errada, boa ou ruim, enfim, perdemos o “senso” de valor.
O importante é mantermos a mente alerta, pois se acostumarmos, facilmente encurtaremos a visão e logo estaremos aceitando tudo, e sem perceber, restringimo-nos de viver plenamente. Além de desperdiçarmos a oportunidade de crescermos, nos acomodamos e fechamos os olhos para problemas que ameaçam a evolução humana. Assim como receber vistas queridas, a princípio, sempre algo muito agradável, mas ao exigir adaptações e mudanças de rotina que ameacem a nossa zona de conforto, optamos por nos privarmos de conviver com o visitante.
A minha visita já se foi, mas deixaram muitas lições, entre as quais, a de não me acostumar com o que deveria ser inaceitável. Boa semana.