A SESSENTONA

– para Cecília Bothona, confreira de Letras, em Porto Alegre/RS

Sessentonas são assim: meio maternais, meio assanhadas, principalmente se descasadas. Só perguntam, ao parceiro da hora, descaradamente: tens carro? Sabe, gosto de dançar e de praia, mas esta fica tão longe...

Acaso sejam Beatriz, Julieta ou Domitila, apaixonam os seus amados e os prendem até a morte.

Mas há outras que apaixonam a todos: são as Cecílias. Lembram de Cecília Meireles? Até balcões e sacadas mineirinhas suspiram por ela a toda vez que revive num de seus poemas.

Assim é a vida com Cecília Bothona, que sussurra aos meus ouvidos há mais de vinte e cinco anos. E sabe ser feliz a sua moda: amando a todos que a cercam, sem sequer lhes pedir nomes ou títulos. Só sabe saudar a vida! E faz isto todos os dias que Deus botou no mundo.

Por esta suprema razão neste dia oloroso de verdes, no pátio de sua casa, escrevinho, à sombra, os parabéns antigos e desejosos de férteis amanhãs.

A vida merece Cecília e Cecília a merece. Como esta fruta que cai no chão carregadinha de sementes. Dia desses será árvore e dará frutos. Por sua singeleza, diria que ri do tombo. Deita e rola, agora, e displicentemente, ajoja-se aos meus pés como se chupasse o dedão.

Bem que achava que os seus frutos eram os “amigos”, e ela, inominada, deveria se chamar a “Árvore da Amizade”. É uma formosa plantinha desde cedo. Frutificou-se temporã. Os frutos têm a forma de um coração. São de cor vermelho-sangue e pulsam ao som rouco dos afagos. Sempre parecem falar num ronronar de gatos.

A vida é assim: sessenta anos é um mágico fetiche. Já se sente o cheiro dos perfumes mesmo dentro do frasco.

Os frutos do viver brincam como gatinhos novos, e mamam, placidamente, na mãe de gordas tetas.

O lirismo do leite na boca tem um doce nome: Esperança.

– Do livro O HÁLITO DAS PALAVRAS, 2006/2009.

http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/1444397