23/04/2006 19h45
De Passarins
De Passarins...
Clevane Pessoa de Araújo Lopes



Sim,alimento as pardais e as rolinhas ,para elas,essas avezinhas meras,compro canjiquinha,painço,alpiste e ou de meu próprio pão...
Estou aprendendo a linguagem das rolinhas,que têm um código de asas muito interessante.Para guardar território,para espantar,atrair,expulsar .
Minha amiga ,a pintora Neuza ladeira,contou-me que na Tailândia são aves preciosas e sagradas.
Engraçadinhas,dão a impressão de serem meigas,se essa palavra pode ser aplicada às avezinhas.Mas,pelo observo com meu olhar de desenhista e poetisa,são extremamente belicosas.Levam a luta aos ares,em rodopio.em vão ponho bocadinhos aqui e outros ali,no beiral de meu terraço.Brigam prá valer...Enfrentam as pombas espaçosas que descem atraídas pelos grãos,bravamente.E batem nas rolinhas menores,as bebês um pouco menos querelentas.E quando as assusto sem querer,com meus passos em chinelinhos de cetim,voam para os fios em frente e fingem que não estão vigiando a comida.De vez em quando,fazem que olham .Quais as mocinhas de antigamente.Assim que sossego,voam de volta.
Os pardais são cheios de algaravia,ainda não lhes decodifico o linguajar.Chiam e chiam.Acordam-me pela manhã.Invadem-me a casa,entram por qualquer cantinho e depois rodopiam desesperados,à procura da liberdade.Já criei-mais ou menos-um pequenino que ,machucado,tolerava minha proximidade.Eu o chamava de Jeremias,uma graça.Os menininhos pardais entram pela sala sempre de porta sempre aberta e,pulinho aqui,pulinho acolá,não são muito medrosos do bicho-mulher.Depois que saem para o mundo,à força de serem escorraçados,de se assustarem com os carros que passam,ficam arredios e medrosos...
Há uma família de bem-te-vis,que longe de ter as asas controladas como as das rolinhas, são de uma alegria enlouquecida.Parecem torcedores com pompons nas mãos..Agitam o que podem,rumorosos e encantadores,listrinhas amarelas na cabeça e peito de camisa idem...
Claro,coloquei água para os beija-flores.Um dos bebedouros veio com néctar,mas será que é possível coletá-lo com essa facilidade? Misturo um tantico de açúcar.Mascavo.Ou mel.Eles adoram e com precisão enfiam os bicos longos e finos entre o orifício da corola.A flor é de plástico,mas eles parecem não se importar.Brigam pelo território,como os demais.aqui,espaço no ar.Um foi expulsar com tanto ímpeto o invasor,que o bebedouro foi lançado a muitos metros de distância e se quebrou.Ele andou uns dias passando á procura,até que comprei outro.Há uns colibris micro,outro,do tamanho de andorinhas,e com elas se parecem,rabinhos em tesoura.
meu marido Eduardo,sabendo dessa minha paixão por passarinhos,veio contar-me que ouvira em uma reportagem na Tv,que á noite,de tão cansados,os beija-flores desmaiam.Nada os faz acordar.Desde então,corro meu olhar noturno pela noturna noite-com redundãncia proposital-para ver seentre moitas,encontro essas maravilhas que param no ar batendo asasinhas deforma quase inacreditável,coraçãozinho batendo alucinadamente...
Tenho uma coleção de gravuras reproduzidas de beija-flores de famílias várias,pintadas pelo pintor naturalista Etiene Demonte.São de tal forma perfeitas em detalhes,que nem sei de que forma o artista pode fazê-lo.Numa delas,descrevendo o beija-flor "Bico-de-sabre"(Heliothrix aurita auriculata),o especialista Augusto Ruschi chega a atribuir emoções humanas à avezinha:

"A parada nupcial do Heliothrix se desenrola com maior destaque nas fases de apresentação e exibição de plumagem".sei,no reino animal,isso é comum.Igualzinhos a nós,humanos...E continua:"na apresentação,o macho,em vôo de libração,se põe diante da fêmea a 30cm,e em vôo,para cima e para baixo e para os lados,como se estivesse a dar pequenos saltos,pois se lança a tais distâncias,e estanca de etapa em etapa,abrindo e fechando a cauda.Em vôo acompanha a fêmea(é,aparece que os machos humanos aprenderam nessa cartilha!)fazendo ascenção em rodopios,para descer a outro pouso onde se segue a fase de exibição de plumagem.Então,o macho,fazendo vôos de libração,faz saltar os tufos violeta laterais,tornando-os bem salientes,e a parte enegrecida que contorna tais tufos.Fica em constante movimento,além de abrir a cauda em leque para,de quando em quando fechá-la e abrí-la,até que a fêmea,já psicologicamente conquistada,se entrega".Entre os humanos,as mulheres usam desses artifícios de conquista.E as gueixas,com seus leques,na dança?!..
Quando levante-me para ir à pasta,buscar uma das gravuras que peguei aleatoriamente,não sabia que encontraria a resposta para a pergunta crucial ONDE DORMEM OS BEIJA_FLORES?:O dormir é realizadoem pouso,em local alto e no emaranhado da vegetação de uma copa fechada",conta Ruschi ,o ornitólogo minucioso.Por isso não os encontro quando os procuro ,à noite...
O desenhista Etiene ilustra o locus de observação com perfeitas cópias de vegetação...Que lindeza,meu Deus...
Noutro dia,eu queria comprar uns periquitinhos,para ter melhor de quem cuidar.meu filho Gabriel assombrou-se e proibiu veemente.Não quer morar em um lugar onde nada esteja preso,ele que ama a natureza e a liberdade dos seers.Aquiesci.Em vão o vendedor me disse que as avezinhas coloridas já nascem em cativeiro et blá-blá-blá...
Uma vez,conheci uma senhora que deveria chamar-se D.Rolinha,tal sua semelhança:baixinha,encantadora,tão rolicinha (tão rolinha!).Peitoral arredondado e farto,que quando ia embarcar,as aeromoças gentilmente as deixavam tomar o avião na frente dos demais.Acreditavam-na grávida e ela,sorridente,aquiescia.Dulcíssima.Mas ai de quem lhe quisesse tomar o território:deu uns tapas na cara da amante do marido,brigou com todos os meninos que brigavam com seus filhos.Virava ave de rapina.Só lhe faltava o tamanho...