Gosto de perscrutar as estrelas e ficar imaginando o que poderia estar acontecendo em qualquer delas nesses momentos de contemplação e platonismo. É quando, então, mil possibilidades vão se aglomerando no pensamento, conjeturas ainda mais intermitentes porque resultante da fascinação que esses iluminados astros me exercem. Voltado ao instante de suspiros e sussurros da alma, vou-me deixando levar pelas horas, no silêncio ou sob o burburinho, os olhos passeando de uma estrela para outra e quase me pego a contá-las como faria uma criança encantada com os seus mistérios e distanciamento.
Na minha infância, longe da TV e quando ainda a globalização não fazia parte do nosso cotidiano, os adultos nos advertiam para não contar estrelas apontando para elas pois nasceriam verrugas nos dedos. Naturalmente isso nos intimidava sobremaneira e não ousávamos de jeito nenhum, nem às escondida, contradizer e enfrentar o conselho. Então, temerosos, embora nunca nos dissessem como as verrugas surgiriam nem porque tal esquisitice poderia acontecer, agíamos conforme o estabelecido. Contudo, não explicavam como as estrelas saberiam que havíamos levantado o dedo indicador na sua direção nem o que havia de absurdo em contá-las com o dedo em riste. Mas nessa época nem pensávamos em questionar orientações de gente "grande", seguíamos à risca a orientação cheios de medo e respeito. Aliás, tais superstições eram passadas de geração em geração mesmo que ninguém soubesse explicar nada sobre o assunto. Simplesmente jogava a bola para a garotada e esperava, certamente, que esses temores simplórios continuassem sem se dar ao trabalho de fazer objeções
Há tanto romantismo nas estrelas quanto num belo luar, temos que reconhecer. Aquelas parecem fosforecer no escuro celeste como vagalumes em intenso frenesi, este difunde sua beleza como uma linda mulher que passa e deixa o rastro de sua magnitude. Tais fenômenos da natureza fazem um bem enorme aos olhos e ao coração, deleitando-nos, conduzindo-nos aos devaneios. Será por que nos é impossível deles nos aproximar? Talvez seja assim mesmo, tudo que se mostra inatingível atrai nossa atenção e nos faz sonhar com a remota possibilidade de chegar o mais próximo possível e, em havendo circunstâncias favoráveis, até mesmo tocar e sentir que é de verdade, palpável. Deve ser esse o motivo da atração irresistível que acalento pelas estrelas. E talvez explique o quanto sou fascinado pela impossibilidade de qualquer aproximação.
Os astrônomos têm pelas estrelas um olhar técnico, científico e pragmático. Nós outros, no entanto, as vemos com os iludidos olhos do coração. O mistério sempre conquistou nossa alma enlouquecida pelo brilho do impossível. É, presumo, em razão da ânsia por novos e desconhecidos rumos, por encontrar o que está bem além de nossa imaginação. Pois certamente o amanhã, ainda distante, faz o coração bater muito mais descontrolado ante o anelo de atingí-lo do que o hoje. Este já está à mão, pode ser apalpado e vivido, aquele permanece uma fria e indecifrável incógnita, página em branco, livro hermeticamente fechado,momento oculto, novidade a ser descoberta. Provavelmente as estrelas são como o amanhã que ainda não chegou.