UMA ÁRVORE FLORIDA
Num Domingo de tarde, resolvi andar de bicicleta no Bairro da Serra. Um bairro muito bonito, com estradas de terras bem conservadas e com paisagens deslumbrantes.
Passando em frente de uma fazenda, lembrei-me de um assistido da Sociedade São Vicente de Paulo, da conferência que participo. A primeira visita que fiz quando passei a fazer parte desta entidade, foi a esta família.
Para chegar até a casa, tive que atravessar um pasto bem grande. Cheio de lama, fezes de boi e com um cheiro de urina insuportável. Mas isso não me desanimou, pois sabia que esta visita trazia-me muitas alegrias.
Chegando na casa da família, casa simples, uma verdadeira casa de caboclo, fui recebido como o Presidente do Brasil.
Luís Roberto era o chefe da família. Homem de estatura baixa, 45 anos, sem nenhum dente na boca, roupas bem simples, sempre com os pés descalços e com uma doença que lhe incomodava muito: hemorróidas. Luiza Maria era sua esposa querida. Uma mulher morena, sempre fumando um cigarro de palha, e carregando o filho mais novo em seu colo, apenas um mês.
Tinham quinze filhos. Chamavam eles: Luciano, Sueli, Taís, Rodrigo, Bruno, Leandro, Leonardo, Luís, Luiza, Maria, Fábio, José, Aline, Vicente e Vitor Alessandro. Este último filho, de apenas um mês, era o caçula. Qual não foi a discussão entre seus pais, para definir o nome do mais novo primogênito. Luís queria Vitor e Luiza queria Alessandro. Numa opinião de um confrade vicentino, ficou decidido: o menino vai se chamar Vitor Alessandro.
As crianças estampavam um sorriso no rosto, quando alguém visitava a casa dos pais. Sabia que algum presentinho vinha, mesmo que fosse uma bala. Era muito difícil irem a cidade, primeiro pela distância e segundo por não terem dinheiro para o ônibus.
Sentei-me no sofá, e comecei conversar com a família. Perguntei sobre o relacionamento familiar deles, e como andava as coisas. Contaram-me que tudo estava bem, apesar de não ter trabalho; as crianças precisando de material para escola e outros gastos de uma família. Foi então que perguntei, o que representa a Sociedade São Vicente de Paulo na vida deles?
Num instante ficaram completamente calados, mas via nos olhos de cada um, uma lágrima escorrendo. Pensei que minha pergunta tivesse sido inconveniente, mas por outro lado, tinha certeza que não era. E todos se surpreenderam, eu muito mais, quando Vicente começou a falar.
Contava apenas com dez anos, mas era um menino muito inteligente. Gostava muito de rezar e sempre que os confrades visitavam a família, ele mesmo queria fazer uma oração. Aquela que aprendeu na catequese, e que ensinou a todos os seus irmãos: o Pai-Nosso.
Como disse, fiquei surpreso, pois achei que seus pais fossem falar, e não um garoto ainda inocente. Enganei-me.
Vicente disse, que a Sociedade São Vicente de Paulo era o combustível que fazia sua família viver. Disse que tinha apenas dez anos, mas que sabia o quanto esta Sociedade fez por sua família, antes que viesse ao mundo.
E comentando muito mais, ele disse:
– Meu pai e minha mãe, casaram porque um ama ao outro. Tiveram muitos filhos, pois não tinham os ensinamentos certos, que diziam para ter menos. Eu sei que precisa ter menos. O mundo está muito difícil e emprego papai e mamãe não têm. Com o que comemos, e com o que vivemos? Acho que a Sociedade São Vicente de Paulo foi à luz para o que estava apagado. E foi aí, que começamos a ter esperança de viver de novo. Todos os meses, você e seus amigos trazem para nós uma cesta cheia de alimentos, e o pouco dinheiro que meu pai ganha do patrão e do governo, vivemos até que bem. Aprendi que o pouco com Deus é muito e muito sem Deus é nada. Muito mais do que alimentos, vocês trazem amor e carinho a todos nós. Trazem o mais importante de que qualquer arroz, a palavra de nosso irmão Jesus. Isso tem feito bem a gente, porque não desanimamos, confiamos muito em Jesus. Por isso, a cada dia agradeço a Jesus, porque ele manda vocês aqui. Chamo-me Vicente, porque meus pais quiseram prestar uma homenagem, a vocês e a entidade que nos ajudou todos estes anos e principalmente quando mais precisávamos. Que o papai do céu dê muito amor a todos vocês e a todos os pobres.
Depois destas palavras, fiquei completamente emocionado. Meu coração batia mais forte, e meus olhos minavam lágrimas, como uma fonte jorra água. Por alguns minutos, as palavras não vinham em minha boca, fiquei parado.
Respirei fundo e falei: Que Deus abençoe a todos vocês, e que ajude você Vicente, a cada dia falar muito mais bonito. O Espírito Santo está com você.
Abracei a todos, e os convidei para que déssemos as mãos e rezássemos. E assim fizemos, rezamos com muita fé, agradecendo a Deus este maravilhoso e encantado momento de graça.
Levava comigo uma sacola, cheia de bombons, o que as crianças mais gostavam. E fizeram uma festa, comeram de se deliciar. Enquanto comiam os bombons, tomei um gostoso suco de laranja, preparado por Luís e Luiza.
Despedi de todos e voltei, pois já estava ficando muito tarde. Subindo pelo pasto, que agora nem parecia tudo o que desagradável era, acenava para as crianças dizendo tchau, até breve.
Na volta, encontrei uma árvore florida, que estava muito linda. Sentei-me naquela sombra e comecei a refletir sobre aquele momento. Ouvia os passarinhos cantar, respirava o ar puro do campo e sentia aquele vento gostoso passar por mim. Era um momento privilegiado, pois o sol estava quase se pondo. Fiquei olhando como a natureza é bela, e como Deus fez tudo perfeito. Avistei uma árvore, que não tinha sequer uma folha. Estava esta árvore muito triste, sem vida, realmente morta.
Enquanto estava debaixo de uma árvore muito florida e bonita, via aquela árvore totalmente acabada. Tudo o que o jovem garoto Vicente falou, me fez chegar a uma conclusão muito verdadeira. Os 170 anos da Sociedade São Vicente de Paulo no mundo, é como uma árvore florida. Muito mais que uma cesta de alimentos, os vicentinos fazem caridade levando amor e paz, e isso faz com que inúmeras famílias, possam florescer em vez de morrer.