Porque hoje é domingo

Ouço a voz torturante do Faustão ecoando na sala e corro para desligar a TV antes que tudo desande. Fico em dúvida se o domingo é chato porque existe o Faustão ou, se o Faustão torna-se insuportável porque existe nos domingos.

Concordo e pratico a sábia lição que diz:” Os incomodados que se retirem.” Neste caso, em que me sinto torturada. Desconecto o aparelho da tomada e dou sumiço ao torturador, antes que ele me mate. Nada pessoal contra o Sr Fausto Silva, desde que ele não entre na minha casa e interrompa o que tento fazer ser, um domingo no mínimo, aprazível.

Procuro entender o que faz do primeiro dia da semana, um dia tão enfadonho. Uma remota lembrança me faz crer que, quando criança o domingo era um dia diferentemente alegre e colorido. Com clima de cinema das quatro, pipoca e guloseimas. Cabeçinhas ao vento voavam felizes nos domingos da infância. Cabeças pensantes começam a se pré-ocupar nos domingos da maturidade.

Talvez seja isto. O domingo, ao mesmo tempo em que é o primeiro dia da semana, é o último dia do nosso final de semana. Quando nos desconectamos da tomada e permanecemos fora do ar, numa sintonia diferente daquela que nos consumiu de segunda à sexta. Domingo é o dia de se plugar novamente e buscar a sintonia propositalmente perdida. Porque é preciso estar ligado quando a segunda-feira raiar e entrar chacoalhando pela veneziana do quarto.

Claro que o domingo tem gosto de festa. Tem o cheiro de comida de mãe. De família reunida em volta da churrasqueira. De música rolando solta enquanto a carne assa. Domingo é para pôr a conversa da semana em dia e atualizar os acontecimentos da sexta e do sábado. Brincar com os filhos. Rever os sobrinhos que a semana leva para longe. Caminhar com o cachorro. Passear na beira do mar. Ler um livro na beira da lagoa. Descansar o corpo, soltar o espírito. Namorar. Domingo tem gosto de festa sim, mas de despedida.

Simplesmente porque é último dia da nossa permissão. Permitimo-nos no final de semana tudo o que coibimo-nos nos outros dias. Arrancamos o plug da tomada e saímos livres, sem pressa, sem preocupação, na sintonia que nos for mais atraente. Domingo é o dia de colocar nossa alma que, não tem idade, não tem tamanho, não tem cor, não tem padrão, de volta no seu casulo. É o dia em que precisamos sintonizar, novamente, no canal da vida real.

Não tem como fugir. A grande sacada é saber que, o equilíbrio consiste em não sermos felizes ou infelizes o tempo todo. E que após a sexta-feira e o sábado inebriante, é preciso que exista o domingo para nos trazer de volta. Conecto-me devagar e tenho até a noite para fazer isto. Mas não permito que a voz do Faustão, do Zeca Camargo, da Glória Maria (hoje, Patrícia Poeta), torne o meu domingão menos fantástico.

Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 08/02/2009
Reeditado em 08/02/2009
Código do texto: T1428844