RUA DAS FLORES, EM CURITIBA

Na manhã do sábado, mesmo sob um calor infernal de mais de trinta graus, como estava na época em que para lá viajamos, vale dar uma despretensiosa caminhada pelo burburinho da Rua das Flores, local onde os curitibanos costumam se reunir para um bate-papo descontraído ou para aquele passeio sem compromisso com o tempo. Uma multidão acalorada desfila pelo local trocando sorrisos, olhares e, por vezes, encontrões no ruge-ruge que se forma. Ali é possível ver de tudo um muito, aliado às cores dos quadros expostos à venda, ao sussurro das conversas, à madorra dos vendedores de artesanato, às gargalhadas dos que bebem nos bares dos arredores e aos gracejos de algum palhaço solitário que resolve fazer graça gratuitamente para os presentes. Troçando dos passantes.

Vimos um sujeito assim no dia em que fomos bater pernas na Rua das Flores transbordando de tanta gente. Afinal de contas, vivíamos o período natalino e o corre-corre para comprar presentes se intensificava. E em meio a tudo isso, bem no núcleo dos que iam e vinham se encontrava ele todo de vermelho, cara pintada, todo metido a engraçadinho para arrancar risadas de quem estava num bar próximo bebendo, fazendo mungangos e tirando sarro dos circunstantes. Quem passasse na frente dele se tornava alvo de suas piadinhas e graçolas, tornando-se o pato ridículo de quem todos riam e zombavam.

Minha esposa, muito mais perspicaz do que eu, notou isso bem mais rápido do que um piscar de olhos e impediu-me de ser a próxima vítima do palhaço. Assim, contornamos pelo lado, aliviado eu quando ela me disse o que estava realmente acontecendo, e paramos já lá adiante para assistir aos infelizes shows proporcionados pelos incautos. Tão-logo eles cruzavam com o palhaço, este abria os braços, o rosto contorcido como a chorar e gritava: "Papá!" Se o sujeito não lhe dava atenção ele lançava uma olhar maroto para o público, acompanhava a vítima apressada e, com o mesmo gesto mas agora exibindo as feições ferinas, bradava em alto e bom som, as mãos nos quadris: "Mamãe!" A galera caía em estrondosa gargalhada, e o coitado do transeunte só faltava procurar um buraco para se enterrar, tão envergonhado ficava.

Num determinado momento, uma senhora caminhava inconsciente do que estava acontecendo e ele, todo risonho, os braços absurdamente abertos e gritando "minha querida amiga!" foi na direção dela. A coitada, sem saber da peça que lhe estava prestes a ser pregada, preparou-se para o abraço transpirando sorriso. Mas o cafajeste, na hora agá, desviou-se dela e, lá adiante, ficou a zombar da pobre senhora, sob as estrondosas gragalhadas da turba satisfeita.

Permanecemos mais alguns instantes assistindo às peripécias do bobalhão que buscava fazer os outros de idiota, aplaudido delirantemente por um bando de desocupados bebericando sua cerveja a um sol de mais de trinta graus. A Rua das Flores ficou menor com aquelas palhaçadas sem propósito. Depois, nos dirigimos para o local onde apanharíamos a "jardineira", espécie de ônibus com dois andares que circula pelos locais turísticos de Curitiba. Assunto para outro dia.
Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 04/02/2009
Reeditado em 04/02/2009
Código do texto: T1422147
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