Agostinho Da Silva
Eu ainda sou do tempo em que o Agostinho da Silva aparecia na televisão dando entrevistas. Muitas frases me ficaram registadas na memória. Tal como aquela figura escorreita e bonita de homem de respeitosa idade. Era um homem atraente. Lembro-me de uma pergunta um bocado parva que uma entrevistadora lhe fez acerca do medo de morrer. E ele, muito calmamente lá lhe disse que simplesmente ele não sabia sequer se iria morrer ou não. Pois o que se sabia até então era que todos os homens tinham morrido. Mas quem sabe não fosse ele o primeiro privilegiado a ser eterno?
Foi nesse momento que percebi que aquele homem era um filósofo. Um filósofo extraordinário.
Ler Agostinho da Silva é passar a ter uma ideia de Portugal muito mais abrangente e completa. Em vez de ficarmos agarrados à nossa ideia das dificuldades actuais. Trata-se de uma valiosa lição de história.
Por outro lado é aprender uma imprescindível lição de vida. Vou apenas fazer uma citação: “ As coisas acontecem, sucedem e agente aproveita ou não. Há um jogo de meninos que, em Portugal, se chama cama de gato: os meninos atam um cordel em círculo, depois fazem assim com a mão, vem outro e faz uma complicação qualquer, mete o dedo e faz outra complicação, vem outro ainda e quanto aos dedos faz assim e tira, e forma outra figura. Este jogo chama-se cama de gato. Então , eu acho que na vida o que há , é um jogo perpétuo de crianças com a cama de gato, que a vida vem de vez em quando e apresenta-nos o problema, olhamos e vemos como é que havemos de tirar, depois metemos os dedos, fazemos assim e sai outra coisa. É que toda a nossa habilidade é tornar a ser crianças para ver como é que sai a cama de gato.”
Este homem, que muitos chamam de místico, humanista, voluntarista, subversivo, pensador perturbante, original escritor, era também um optimista.
E achava que as pessoas em vez de se porem a dizer mal do estado das coisas deviam fazer elas próprias algo, dentro das suas possibilidades, que contribuísse para melhorar o que necessitasse de ser transformado. Foi o que ele procurou fazer sempre. E por isso andou pelo Brasil a plantar universidades. E tornou-se não só um português que para além de ser de Portugal era também do Brasil, país que ele tanto amou. Viu naquela nação capacidades, potencial, qualidades que faltavam a Portugal. Mas nem por isso deixou de ter a ideia de que teria sido ele a escolher o lugar para nascer. A sua teoria do nascer é fenomenal: são as pessoas que enquanto se encontram no mundo das ideias que escolhem o ponto da Terra onde desejam nascer. O seu local eleito foi Barca de Alva mas como é muito difícil fazer os cálculos matemáticos para que um corpo em movimento alcance outro corpo em movimento que é este nosso planeta, houve um engano e ele foi nascer no Porto. Mas logo o erro foi corrigido pois com poucos meses foi viver para Barca de Alva: o sítio que ele escolhera. Como a aldeia é na fronteira com Espanha ele aprendeu duas línguas e culturas ao mesmo tornando-se Ibérico. Preferiu sempre, no entanto, a parte portuguesa, pois dizia que tinha sido tal a esperteza dos portugueses em ficar com o Brasil quando fizeram o tratado de Tordesilhas com os espanhóis que ele não podia escolher outra nação.
Podia estar aqui a falar sobre este extraordinário homem dois dias seguidos e não conseguiria fazer-lhe justiça. Podia dizer que aprecio a maneira como critica o Fernando Pessoa, adoro a explicação da metafísica dos Orixás, a comunhão de ideias com São Francisco, o seu conceito do Cristianismo, a sua maneira original de religiosidade que o fazia entrar num tempo Budista no Japão e deitar uma moeda para chamar os deuses deles com a musiquinha que ela fazia ao bater em pauzinhos enquanto rezava uma oração católica. Tudo isto com sinceridade. Ser sinceramente todas as coisas, dizia ele.
O que poderei eu dizer mais? Era, (é) um filósofo português. O melhor de sempre.
Eu ainda sou do tempo em que o Agostinho da Silva aparecia na televisão dando entrevistas. Muitas frases me ficaram registadas na memória. Tal como aquela figura escorreita e bonita de homem de respeitosa idade. Era um homem atraente. Lembro-me de uma pergunta um bocado parva que uma entrevistadora lhe fez acerca do medo de morrer. E ele, muito calmamente lá lhe disse que simplesmente ele não sabia sequer se iria morrer ou não. Pois o que se sabia até então era que todos os homens tinham morrido. Mas quem sabe não fosse ele o primeiro privilegiado a ser eterno?
Foi nesse momento que percebi que aquele homem era um filósofo. Um filósofo extraordinário.
Ler Agostinho da Silva é passar a ter uma ideia de Portugal muito mais abrangente e completa. Em vez de ficarmos agarrados à nossa ideia das dificuldades actuais. Trata-se de uma valiosa lição de história.
Por outro lado é aprender uma imprescindível lição de vida. Vou apenas fazer uma citação: “ As coisas acontecem, sucedem e agente aproveita ou não. Há um jogo de meninos que, em Portugal, se chama cama de gato: os meninos atam um cordel em círculo, depois fazem assim com a mão, vem outro e faz uma complicação qualquer, mete o dedo e faz outra complicação, vem outro ainda e quanto aos dedos faz assim e tira, e forma outra figura. Este jogo chama-se cama de gato. Então , eu acho que na vida o que há , é um jogo perpétuo de crianças com a cama de gato, que a vida vem de vez em quando e apresenta-nos o problema, olhamos e vemos como é que havemos de tirar, depois metemos os dedos, fazemos assim e sai outra coisa. É que toda a nossa habilidade é tornar a ser crianças para ver como é que sai a cama de gato.”
Este homem, que muitos chamam de místico, humanista, voluntarista, subversivo, pensador perturbante, original escritor, era também um optimista.
E achava que as pessoas em vez de se porem a dizer mal do estado das coisas deviam fazer elas próprias algo, dentro das suas possibilidades, que contribuísse para melhorar o que necessitasse de ser transformado. Foi o que ele procurou fazer sempre. E por isso andou pelo Brasil a plantar universidades. E tornou-se não só um português que para além de ser de Portugal era também do Brasil, país que ele tanto amou. Viu naquela nação capacidades, potencial, qualidades que faltavam a Portugal. Mas nem por isso deixou de ter a ideia de que teria sido ele a escolher o lugar para nascer. A sua teoria do nascer é fenomenal: são as pessoas que enquanto se encontram no mundo das ideias que escolhem o ponto da Terra onde desejam nascer. O seu local eleito foi Barca de Alva mas como é muito difícil fazer os cálculos matemáticos para que um corpo em movimento alcance outro corpo em movimento que é este nosso planeta, houve um engano e ele foi nascer no Porto. Mas logo o erro foi corrigido pois com poucos meses foi viver para Barca de Alva: o sítio que ele escolhera. Como a aldeia é na fronteira com Espanha ele aprendeu duas línguas e culturas ao mesmo tornando-se Ibérico. Preferiu sempre, no entanto, a parte portuguesa, pois dizia que tinha sido tal a esperteza dos portugueses em ficar com o Brasil quando fizeram o tratado de Tordesilhas com os espanhóis que ele não podia escolher outra nação.
Podia estar aqui a falar sobre este extraordinário homem dois dias seguidos e não conseguiria fazer-lhe justiça. Podia dizer que aprecio a maneira como critica o Fernando Pessoa, adoro a explicação da metafísica dos Orixás, a comunhão de ideias com São Francisco, o seu conceito do Cristianismo, a sua maneira original de religiosidade que o fazia entrar num tempo Budista no Japão e deitar uma moeda para chamar os deuses deles com a musiquinha que ela fazia ao bater em pauzinhos enquanto rezava uma oração católica. Tudo isto com sinceridade. Ser sinceramente todas as coisas, dizia ele.
O que poderei eu dizer mais? Era, (é) um filósofo português. O melhor de sempre.