FAIXA DE GAZA
Não consigo escrever sobre a guerra na Faixa de Gaza: são mortos, demasiados, uns ao lado dos outros empilhados todos juntos, ocupando-me inteiro o campo mental, todos juntos obscurecendo-me o raciocínio e as palavras, bloqueando o caminho para o outro lado, para a outra margem onde insistem em viver outras pátrias ancestrais de mim, outras pátrias a sangrar, na memória de mim. Demasiados, para uma só mente, para um só coração, para um só pesadelo coletivo que não me cabe, que não cabe em mim.
Com a caixa de Pandora nas mãos, com esta caixa encerrando em seu bojo a Esperança, a Esperança a gritar, a gritar sem poder sair, olho e vejo, ao longo deste campo de mortos, superpostos, outros infinitos campos de mortos de múltiplos rostos e nomes e tempos, todos confundidos ao longo dos séculos e mundos. Olhando-os assim, todos mesclados, impossível perceber quando o ERRO começou. De mais perto porém, a Morte, com sua foice descomunal, tem nome, assim como tem nomes a História, nomes de atroz ironia, em todos os lugares e tempos nomes da ironia mais atroz.
Olho ao redor, olho por dentro de mim e não encontro as palavras para uma oração. Não encontro as palavras para nenhuma oração.