CONVERSA PRÁ BOI DORMIR

Já reparou o leitor nas feições dos animais? Botei meu reparo na cadela daqui de casa (a Flor) para descrever com precisão humana essas expressões que a gente nota, mas não fala por vergonha da tolice ou por acreditar na impossibilidade de manifestações sentimentais nesses seres vivos que chamamos de irracionais. Eu acho que os bichos podem até não pensar mesmo, mas que eles manifestam sentimentos, ah, isso lá é verdade. Está na cara! Os cães têm um olhar que é o símbolo natural da humildade. De vira lata a pit bull, sem exceção, basta observá-los quando estão sozinhos ou na calmaria e trocar com eles um olhar. Parece que estão querendo chamar a atenção para a sua presença e que precisam de correspondência, seja do dono ou de quem estiver olhando-o e que lhe seja simpático ou agradavelmente não agressivo. Uma olhadinha que seja, se não for possível um afago e se o interlocutor não tiver medo. E nem precisa ter, porque, se existe sinceridade em um olhar, ela foi dada às crianças e aos cachorros. A gente vai perdendo com o tempo, os cães não.

Por outro lado, os gatos possuem um tom ameaçador à primeira vista. Nem que seja por instinto de defesa e sobrevivência. Já cruzou com algum à noite, estático, lhe observando com aqueles olhos vidrados e difundindo luz, como se fossem o facho de uma lanterna colorida? É bonito, mas dá um medo danado. Talvez a associação que fazemos desse animal com coisas de bruxaria tenha partido desse comportamento deles. De outras coisas malévolas que o gato faria para gerar essas crenças, nunca ouvi dizer. É tão manso que empresta sua apatia aos indolentes. Quem nunca ouviu ou mesmo chamou alguém de “mais manso que gato de hotel?”, ou, “manso que nem gato em beira de fogão a lenha.”?

Agora, os pássaros e as aves em geral, que vivem no fio da navalha, quer dizer, são presas fáceis para tudo quanto é bicho, tem o mais arisco semblante que já se viu. Os olhos dos pássaros, pombos e outros seres voantes, giram que nem uma bola. Não sei não, mas devem enxergar em todas as direções ao mesmo tempo. Só amansam quando têm a certeza de que o dono não lhes quer como alimento ou mesmo quando é fácil decolar diante da iminência de um ataque. Mas há também as chamadas aves de rapina. Ocorre que essas são exceção. Até porque vivem em alturas tão grandes, que só vêm aqui em baixo para buscar uma comida e voltam de imediato para seu lar, seja nas montanhas elevadas ou simplesmente disputando no céu espaço com aviões e outros maquinismos voadores.

Dos bichos que já me proporcionaram a oportunidade da observação, o que mais me comove é o boi. E o termo exato que consegui encontrar para definir o seu olhar e resignação até para andar é: comovente. A sensação que seu olhar transmite é a de que sabe que tem de cumprir sua triste sina rumo ao matadouro, mais dia, menos dia. E vive por isso, com aquele olhar de profunda tristeza. Se nos imbuirmos de sentimentalismos num curral cheio e ficar alguns momentos cruzando olhares com bois, vacas e bezerros, creio que, por piedade ou solidariedade, deixaremos de gostar da carne desse animal tão indispensável à nossa saúde. Desculpe-me, leitor se por acaso fizer essa leitura antes do almoço, jantar e estiver diante de um prato com um suculento e cheiroso bife.

josé cláudio Cacá
Enviado por josé cláudio Cacá em 03/02/2009
Código do texto: T1419378