Por um pedaço de pão
(um caso real de abandono)
Pensei que seria uma quarta-feira comum como todas as outras. Depois de passar uma hora arrumando os cabelos, fui caminhando rumo à igreja para a novena, no meio da tarde.
Terminada a novena, não foi à toa tanta água benta que o vigário jogou sobre a minha cabeça, pois o que viria depois necessitava era de um balde bem cheio daquela água.
Cheguei à porta da secretaria da casa paroquial, para pegar alguns papéis quando me deparei com uma cena chocante:
- um garoto de doze anos, que na verdade aparentava menos
idade, ladeado por dois policiais, que lhe faziam perguntas, e o ameaçavam de levá-lo ao conselho tutelar.
Um choque para meus olhos e ouvidos de mãe-catequista: - Um menino, era apenas um menino... roubara um pedaço de alumínio. Perguntado a ele o motivo de tal ato, respondeu que venderia o material para comprar pão e, teria que alimentar seus três irmãos que ficaram em casa.
- Onde trabalha sua mãe ?
- Não sei
- E seu pai ?
- Parece que é na Trevo Veículos * mas não tenho certeza.Ele é mecânico, mas bebe muito e quase toda noite bate na gente.
- Sua mãe também bate em você ?
- Bate, mas só de vez em quando.
Os policiais gritam de novo com o menino e afirmam que se ele não disser onde é o local de trabalho dos pais, eles terão que levá-lo ao tal conselho tutelar.
Eu, que tinha um sapo, uma cobra e um carneiro atravessados na garganta, indaguei aos policiais:
- E a catequista não pode ficar com a guarda dele até que a mãe chegue em casa ?
- Pode sim, a senhora só tem que assinar aqui, aqui e aqui. Me dê sua identidade, cic, habilitação, endereço, telefone, nome de duas testemunhas, etc... etc.. etc...
- Ótimo ! Vejam que com essas duas assinaturas e mais
“5 pilas” vocês podem ir ao cinema no Shopping Curitiba, de Segunda a Quinta. (infame, mas não me ocorreu piada melhor naquele momento e eu queria aliviar a tensão) - Fiquei com a guarda do menino, levei-o à lanchonete e fizemos um lanche... ele mal engoliu o sanduíche e não creio que tenha sentido qualquer sabor naquele alimento. O medo tomava conta dele. Não sei do que ele tinha mais medo, se da surra do pai, da decepção da mãe, ou da possibilidade de ser levado para o tal conselho tutelar.
Decidimos não contar à mãe o que aconteceu. O vigário e uma assistente social irão acompanhar o caso. É quase certo que, com o apoio da igreja e da comunidade, salvaremos aquela família. Pelo menos uma, podemos garantir. Não se pode fazer tudo por todos os que roubam um pedaço de alumínio para comprar pão. Alguns querem comprar solventes e seus afins... sei lá!
Por um pedaço de pão, vi um menino de doze anos, totalmente fragilizado em meio a dois policiais, me olhava assustado com seus olhinhos arregalados.
Por um pedaço de pão e um pouco de vinho, nosso Deus se tornou refeição na última sexta-feira, santa para os cristãos. Antes de sua morte, ele pediu que se fizesse memória daquele momento... e nós fizemos! Mas aquele menino... ah! aquele menino, estava lá, na primeira fila de bancos da nossa igreja, e me sorriu... Agora somos cúmplices... por algum tempo, enquanto pensamos no que fazer com ele.
* Uma empresa fictícia para preservar o trabalho do pai do garoto
(um caso real de abandono)
Pensei que seria uma quarta-feira comum como todas as outras. Depois de passar uma hora arrumando os cabelos, fui caminhando rumo à igreja para a novena, no meio da tarde.
Terminada a novena, não foi à toa tanta água benta que o vigário jogou sobre a minha cabeça, pois o que viria depois necessitava era de um balde bem cheio daquela água.
Cheguei à porta da secretaria da casa paroquial, para pegar alguns papéis quando me deparei com uma cena chocante:
- um garoto de doze anos, que na verdade aparentava menos
idade, ladeado por dois policiais, que lhe faziam perguntas, e o ameaçavam de levá-lo ao conselho tutelar.
Um choque para meus olhos e ouvidos de mãe-catequista: - Um menino, era apenas um menino... roubara um pedaço de alumínio. Perguntado a ele o motivo de tal ato, respondeu que venderia o material para comprar pão e, teria que alimentar seus três irmãos que ficaram em casa.
- Onde trabalha sua mãe ?
- Não sei
- E seu pai ?
- Parece que é na Trevo Veículos * mas não tenho certeza.Ele é mecânico, mas bebe muito e quase toda noite bate na gente.
- Sua mãe também bate em você ?
- Bate, mas só de vez em quando.
Os policiais gritam de novo com o menino e afirmam que se ele não disser onde é o local de trabalho dos pais, eles terão que levá-lo ao tal conselho tutelar.
Eu, que tinha um sapo, uma cobra e um carneiro atravessados na garganta, indaguei aos policiais:
- E a catequista não pode ficar com a guarda dele até que a mãe chegue em casa ?
- Pode sim, a senhora só tem que assinar aqui, aqui e aqui. Me dê sua identidade, cic, habilitação, endereço, telefone, nome de duas testemunhas, etc... etc.. etc...
- Ótimo ! Vejam que com essas duas assinaturas e mais
“5 pilas” vocês podem ir ao cinema no Shopping Curitiba, de Segunda a Quinta. (infame, mas não me ocorreu piada melhor naquele momento e eu queria aliviar a tensão) - Fiquei com a guarda do menino, levei-o à lanchonete e fizemos um lanche... ele mal engoliu o sanduíche e não creio que tenha sentido qualquer sabor naquele alimento. O medo tomava conta dele. Não sei do que ele tinha mais medo, se da surra do pai, da decepção da mãe, ou da possibilidade de ser levado para o tal conselho tutelar.
Decidimos não contar à mãe o que aconteceu. O vigário e uma assistente social irão acompanhar o caso. É quase certo que, com o apoio da igreja e da comunidade, salvaremos aquela família. Pelo menos uma, podemos garantir. Não se pode fazer tudo por todos os que roubam um pedaço de alumínio para comprar pão. Alguns querem comprar solventes e seus afins... sei lá!
Por um pedaço de pão, vi um menino de doze anos, totalmente fragilizado em meio a dois policiais, me olhava assustado com seus olhinhos arregalados.
Por um pedaço de pão e um pouco de vinho, nosso Deus se tornou refeição na última sexta-feira, santa para os cristãos. Antes de sua morte, ele pediu que se fizesse memória daquele momento... e nós fizemos! Mas aquele menino... ah! aquele menino, estava lá, na primeira fila de bancos da nossa igreja, e me sorriu... Agora somos cúmplices... por algum tempo, enquanto pensamos no que fazer com ele.
* Uma empresa fictícia para preservar o trabalho do pai do garoto