A Forca
Seus olhos estão velhos e cansados, e podem apenas se focar no filho que costumava ser. O filho ruim que costumava ser.
Tentou afastar os lábios, para que a água preenchesse seus pulmões de maneira mais célere.
E de todo (esse) tempo afogado, tudo que lembrava eram das noites em claro que vivenciou por causa dela.
Os resquícios do seu perfume e frases manipulativas o assombram como nunca.
Ela começou a morrer já faz três anos e ele gostaria que o inferno existisse mil vezes mais para que a certeza de tudo que tiveram hoje em dia queima, não apenas dentro dele.
Ainda existem lembranças dela dentro dele, costuradas em seu corpo e olhos.
Essas são as mesmas que outrora o deram vida.
Essas são as mesmas que outrora o deram amor.
Essas são as mesmas que outrora o deram esperança.
Essas são as mesmas que outrora o deram dor.
Essas são as mesmas que outrora o fizeram desejar que (nada) nunca tivesse existido.
Ela ainda está morrendo, e há pouco percebi. Ele ainda respira, mas deveria ter parado há muito tempo atrás.
Conheço seu coração, conhecemos seu coração. Mas ninguém tem motivo nenhum para dar-lhe qualquer coisa.
Ele ainda sente falta dela e da época que ainda estava viva.
Ela deu tudo a ele, e essa consciência ainda é tão forte e sufocante, que se prende em seu pescoço como uma forca.
Ele quer nadar até o fundo do mar e dá-la aquela caixa que caiu trancada junto com sua chave há três anos atrás.
Mas algo o ancora na baia desses pensamentos, de maneira que olhar pra trás perde o sentido a cada instante.
Ele gostaria apenas de ter asas grandes o suficiente para impedir que tudo isso caísse no esquecimento, mas infelizmente não há nada que possa ser feito.