Viciados em...
Algum vício é menos relevante que o outro? Estou na sala e a televisão está ligada Uma propaganda de TV me chama a atenção. O anunciante oferece ao consumidor na embalagem pet quase três litros e meio de refrigerante.Não é muita coisa?
Meu pai, um comerciante da década de 80 era dono de uma modesta mercearia.Vez ou outra, no final o dia, ele trazia consigo um litro de refrigerante.Dividíamos entre quatro pessoas e ainda sobrava um tantinho.Fiquei pensando como ao longo dos anos o consumo de refrigerante aumentou.Um litro já não basta.
O comercial me fez ainda lembrar de Nice, uma amiga viciada em Coca-Cola, ou como ela mesma se autodefine, “cocólatra”. Já chegou a consumir, sozinha, quatro litros. Na adolescência, a mãe assustada com o vício, passou a proibir a ingestão. Então, para driblar a vigilância materna, passou a esconder garrafas pela casa e a cada esconderijo descoberto, ela tratava de encontrar um outro mais eficaz: a caixa d’água nunca foi descoberta.Tentou parar várias vezes.Procurou ajuda em grupos de viciados:
- Oi, meu nome é Janice.Sou viciada em Coca.
- E há quanto tempo é viciada em cocaína? – perguntou a coordenadora do grupo.
- Cocaína? Não! Sou viciada em Coca-Cola!
Gargalhada geral.Encabulada sentir seu vício "menor" e menos importante que os outros, não voltou mais à reunião.
Tarde da noite.O casal vai dormir.Algum tempo depois, vendo que o parceiro dorme, ela se levanta e volta para o computador.Durante o dia, já verificou seus e-mails, orkuts, fotologs, mas agora está lá apenas para fuçando, navegando. Horas depois, ele sente a cama vazia:
- Vem deitar!
- Já vou, é rapidinho – mente. Viciada em Internet.
Tem também o sujeito que come, almoça e janta em frente ao computador.Outro viciado em msn? Não, viciado em trabalhar, é workaholic.
Dizem que as formigas são trabalhadeiras.Com ele, são ainda mais, pois vivem em seu teclado cheio de migalhas de tudo quanto é coisa.
- É pra ganhar tempo – justifica-se.
Descendo a ladeira, vai um moleque em sua bicicleta. Pega velocidade, abre os braços, e pasmem, fecha os olhos!!! Às vezes, pega carona na traseira do ônibus, deixando o motorista doido de raiva e deveras preocupado.Viciado em adrenalina: vive estourado, machucado, ralado.Desafia a morte com tão pouca idade.
- Não sei mais o que fazer com esse menino! – diz a mãe quando um vizinho lhe avisa de mais uma aventura do filho.
Olhando em torno, quantos neoviciados a gente não vê por aí, não? Sinal de alerta! E quem disse que escrever também não é um vício? Eu confesso que sou dependente.
A virtude é quando se tem a dor seguida do prazer; o vício é quando se tem o prazer seguido da dor”- Margaret Mead.
(Maria Fernandes Shu - 29 de janeiro de 2009)
* imagem:Socrates afastando Alcebíades do vício. Óleo sobre tela, 1865. Nesta imagem, pode-se observar uma acepção genérica do conceito, não relacionado ao uso de drogas, mas ao prazer.
Algum vício é menos relevante que o outro? Estou na sala e a televisão está ligada Uma propaganda de TV me chama a atenção. O anunciante oferece ao consumidor na embalagem pet quase três litros e meio de refrigerante.Não é muita coisa?
Meu pai, um comerciante da década de 80 era dono de uma modesta mercearia.Vez ou outra, no final o dia, ele trazia consigo um litro de refrigerante.Dividíamos entre quatro pessoas e ainda sobrava um tantinho.Fiquei pensando como ao longo dos anos o consumo de refrigerante aumentou.Um litro já não basta.
O comercial me fez ainda lembrar de Nice, uma amiga viciada em Coca-Cola, ou como ela mesma se autodefine, “cocólatra”. Já chegou a consumir, sozinha, quatro litros. Na adolescência, a mãe assustada com o vício, passou a proibir a ingestão. Então, para driblar a vigilância materna, passou a esconder garrafas pela casa e a cada esconderijo descoberto, ela tratava de encontrar um outro mais eficaz: a caixa d’água nunca foi descoberta.Tentou parar várias vezes.Procurou ajuda em grupos de viciados:
- Oi, meu nome é Janice.Sou viciada em Coca.
- E há quanto tempo é viciada em cocaína? – perguntou a coordenadora do grupo.
- Cocaína? Não! Sou viciada em Coca-Cola!
Gargalhada geral.Encabulada sentir seu vício "menor" e menos importante que os outros, não voltou mais à reunião.
Tarde da noite.O casal vai dormir.Algum tempo depois, vendo que o parceiro dorme, ela se levanta e volta para o computador.Durante o dia, já verificou seus e-mails, orkuts, fotologs, mas agora está lá apenas para fuçando, navegando. Horas depois, ele sente a cama vazia:
- Vem deitar!
- Já vou, é rapidinho – mente. Viciada em Internet.
Tem também o sujeito que come, almoça e janta em frente ao computador.Outro viciado em msn? Não, viciado em trabalhar, é workaholic.
Dizem que as formigas são trabalhadeiras.Com ele, são ainda mais, pois vivem em seu teclado cheio de migalhas de tudo quanto é coisa.
- É pra ganhar tempo – justifica-se.
Descendo a ladeira, vai um moleque em sua bicicleta. Pega velocidade, abre os braços, e pasmem, fecha os olhos!!! Às vezes, pega carona na traseira do ônibus, deixando o motorista doido de raiva e deveras preocupado.Viciado em adrenalina: vive estourado, machucado, ralado.Desafia a morte com tão pouca idade.
- Não sei mais o que fazer com esse menino! – diz a mãe quando um vizinho lhe avisa de mais uma aventura do filho.
Olhando em torno, quantos neoviciados a gente não vê por aí, não? Sinal de alerta! E quem disse que escrever também não é um vício? Eu confesso que sou dependente.
A virtude é quando se tem a dor seguida do prazer; o vício é quando se tem o prazer seguido da dor”- Margaret Mead.
(Maria Fernandes Shu - 29 de janeiro de 2009)
* imagem:Socrates afastando Alcebíades do vício. Óleo sobre tela, 1865. Nesta imagem, pode-se observar uma acepção genérica do conceito, não relacionado ao uso de drogas, mas ao prazer.