Procura-se o culpado
Um dia destes fui a um restaurante de frutos numa cidade litorânea próxima da minha. Escolhi o local por ter uma aparência externamente agradável. Ao entrar, entretanto, percebi uma dissonância entre os ambientes. O layout interno que também era atraente havia sido tomado por uma profusão de cartazes feitos no computador, colados em todas as paredes.
Enquanto um anunciava promoção de filé de peixe, o outro o rodízio de frutos do mar e mais outro de camarão e assim sucessivamente. Todos repetidamente expostos, disputando a atenção com os cartazes promocionais de cerveja e refrigerante. Somente se olhasse com muita atenção o cliente enxergaria, entre o festival de anúncios, a decoração original que, era composta de quadros e enfeites com motivos náuticos, de muito bom gosto.
Dirigi-me ao banheiro e quando lá cheguei, percebi que este ambiente, íntimo e reservado, não tinha saído imune ao despreparo do “prega-cartaz”. Sobre a pia havia a inscrição amedrontadora: “NÃO MOLHE O CHÃO. ISTO NÃO É CHUVEIRO.” Lavei as mãos com o maior cuidado que um ser humano pode despender para que as gotas excedentes não pulassem para fora da pia. Me virei para pegar a toalha de papel, quando os meus olhos, ainda atônitos, receberam a mensagem: “DUAS FOLHAS SÃO SUFICIENTES PARA SECAR SUAS MÃOS. COLABORE!”
Olhei para as minhas mãos e o volume de água que ainda permanecia nelas e puxei com todo cuidado: uma e duas. Quando a terceira folha ameaçou sair da papeleira enfiei-a rapidamente para dentro, temerosa de que houvesse ali naquele recinto privado, uma câmera registrando cada folha a mais que o cliente consumisse para depositar na conta, junto com a despesa do almoço.
Ao sair do banheiro ainda pensando nas palavras ríspidas dos lembretes antipáticos do banheiro, dei de cara com um freezer modelo horizontal vermelho, dividindo dois ambientes do restaurante. Na porta do antiquado objeto que devia estar cheio de bebidas, ressaltavam-se as letras de outro aviso bizarro: “NÃO ABRA! NÃO É PIA DE ÁGUA BENTA”.
Aturdida voltei para a mesa. Sem muita demora o garçom trouxe o filé de peixe grelhado que eu havia pedido muito bem elaborado em um prato que encantava aos olhos e, logo após confirmei, também ao paladar. Durante o almoço tive tempo para ler alguns das centenas de cartazes e descobrir que, em meio à enxurrada de informações à minha volta, não percebi que o CAMARÃO estava sendo oferecido pelo mesmo preço do FILÉ DE PEIXE. Na intenção exagerada de informação, o “prega-cartaz” acabou me confundindo.
Ao final, o garçom trouxe a conta e mostrou-se preocupado em saber se fiquei satisfeita. Respondi que sim e agradeci sua gentileza. Levantei e me dirigi à porta de saída. Durante o curto percurso senti um impulso incontrolável de olhar para trás e repetir ao gentil garçom as palavras que eclodiam em minha mente: “CADÊ O GERENTE? ELE PRECISA PARAR O PREGA-CARTAZ ANTES QUE O MAU GOSTO ESPANTE O ÚLTIMO CLIENTE.”
Respirei fundo e reprimi o meu impulso. Vai que o gerente é o culpado! Ou o garçom! Quem sabe a cozinheira que preparou com tanto esmero o meu almoço! Será que sou eu, a última cliente? Nunca mais voltei para descobrir.