Quando os santos não batem

Há algum tempo recebi a sugestão de alguém, quase um pedido, para que eu escrevesse sobre “quando os santos não batem”. Deixei o assunto quieto num canto até coletar subsídios suficientes que me permitissem discorrer sobre ele.

Uma coisa é inegável: todo mundo tem no mundo um santo que não bate com o seu. Mas é preciso ir mais além desta dedução popular, uma vez que botar a culpa no santo é uma coisa que soa com um quê de irresponsabilidade de nós conosco mesmo. Ou seja, a culpa passa a ser do santo e não nossa.

Assim falando parece que cada um possui um santo que vive dentro de si e que é um tipo rebelde que quando cisma de não simpatizar com a cara do santo do outro, não há Cristo que o faça ceder. Até que se prove o contrário, não existe nenhum santo ou capeta soprando nos nossos ouvidos o que devemos ou não, sentir ou fazer. O primeiro passo, portanto, é admitir que nós somos os nossos próprios santos ou capetas. E cabe apenas a nós a culpa ou a graça de “bater” ou não com o outro.

Feitas as devidas considerações sobre as devidas responsabilidades, é preciso admitir a existência da antipatia imediata entre certas pessoas. Talvez a razão para colocarmos a culpa em cima do santo seja, justamente, por esta antipatia ser inexplicável a nós mesmos. Certas pessoas exercem aversão sobre outras sem que haja um motivo relevante. Algumas vezes a coisa é visual. Olhou, não gostou e pronto. Noutras, além da impressão visual existe a repulsa comportamental, ou seja, aquele ou aquela possui atitudes que não vem ao encontro dos princípios do outro. Pelo contrário, chega esbarrando mesmo.

O que é isto senão as tão citadas diferenças entre este e aquele? Ninguém é igual a ninguém, ao mesmo tempo em que ninguém possui o direito de querer o outro à sua imagem e semelhança. Se Deus que é Deus, nunca conseguiu. Somos díspares, e ironicamente somos seres grupais. Em meio às dezenas de pessoas que convivemos todos os dias, invariavelmente, batemos de frente com a nossa antítese. E isso nada tem a ver com a procedência ou a hierarquia do santo de um ou do outro.

Gosto de pensar nas coisas como um resultado de uma cadeia energética. Seres distintos produzem energias dissonantes e quando elas se chocam soltam faíscas inevitáveis. Cabem duas soluções a este atrito involuntário: tentar harmonizar as vibrações, e para isso é necessário uma grandeza espiritual muito desenvolvida, ou manter a devida distância do “objeto” dissonante evitando, assim, a ocorrência de um curto circuito.

Deixando os santos em paz e tomando para nós a carga energética que geramos ou captamos, guardemos em nossos arquivos sensoriais a frase do poeta americano Henry Longfellow:, “Se pudéssemos ler a história secreta dos nossos inimigos, descobriríamos na vida de cada um mágoas e sofrimentos suficientes para desarmar qualquer tipo de hostilidade”.

Léia Batista
Enviado por Léia Batista em 25/01/2009
Reeditado em 25/01/2009
Código do texto: T1403582