A máquina (Corona)

Ela ficava fechada sobre a escrivaninha.

Era a peça mais importante do escritório.

A capa dura -uma maleta - revestida de couro preto lhe dava classe.

O cheiro de tinta era agradável. De limpeza e ordem.

No fundo , não é muito bom falar sobre a máquina

de escrever do meu avô Nemézio.

Computando tempo, vão me achar da idade da pedra.

Mas não é assim tanto ! Pode crer.

Estranhos são os pequenos detalhes que ficam guardados

na memória . Estranho é esse tempo correndo feito maluco sem nunca

estacionar em lugar nenhum . Tão abstrato e tão real .

E , de repente, à vista de um objeto bastante esquecido feito peça de museu , outras lembranças vem se juntar.

Tardes inteiras a perambular pela sala aconchegante

tendo o carinho do avô materno tão especial.

Não que fosse muito de agradar, alisando.Era meio sisudo.

Meio distante e quieto. Imponente.

Mas o seu olhar , cheio de ternura , muita paciência e aquele

estar à vontade sempre disfarçando para orientar .

Estava à disposição. Afinal, parece que avós são para isso.

Para estarem sempre a postos ao redor de seus netos,

instigando processos, ensinando a vadiar com responsabilidade.

Os de hoje também são assim?

E tudo era muito simples e tranquilo.

Colocar o papel com jeito , não deixa-lo enrugar,

cuidando das teclas , não exagerar na batida , escolher a cor.

Preta ou vermelha . Poucas opções mas muita história pra inventar.

E lá ia mexendo , catando milho naquela máquina linda e mágica ( que barulheira), divagando sobre o que escrever sob os olhos atentos de quem fazia de conta que não dava atenção,

nem mesmo tinha o que ensinar...

A despeito de todo o barulho da peça , tanto que só se teclava quando a vovó não dormia para não incomoda-la-,

os antigos nossos passavam lições muito silenciosamente.

Quase mesmo através de olhares , posturas e carinho.

E tudo era fácil , simples , leve ,

sem muitos questionamentos ou correrias.

Parecia fácil de aprender, parecia fácil de ensinar...

lu.f;-)