Água abaixo
Enquanto teclava uma música qualquer, um pernilongo me sobrevoava, logo eu seria sua vítima, se já não tinha sido, mas antes que isso pudesse acontecer ou se repetir, com uma mão eu o tentei pegar, num golpe rápido, enquanto o alcançava eu serrei o punho. Depois abri lentamente a mão pra ver se tinha pego o safado, estava ali, esperneando desengonçado e freneticamente, agoniando na divisa do meu dedão com a mão, bem em cima de uma das linhas da vida. Estava ensangüentado, provavelmente roubou de mim ou de alguém da minha família este sangue, no entanto uma quantidade insignificante do líquido vermelho escuro brilhoso, pensei. E pensando na insignificância, um sentimento de misericórdia começou a exalar do inseto e alastrar por minha mão, seguindo velozmente pelo braço, logo por este caminho, atingiria o coração uma piedade cortante. Consciente de tal situação, a passos largos e ágeis fui até a pia mais próxima e lavei o mosquito e seu sangue roubado de minha mão, olhei pra lá e, lá estava o sol forte, a trepadeira no muro, uma pássaro urbano, bem longe uma nuvem grande e branca, meu violão, uma planta de plástico e outras orgânicas... logo a compaixão já tinha ido toda por água abaixo e eu estava bem.