10 anos, uma quase-vida

Faz hoje, neste dia 11 de Janeiro 10 anos que acabei um dos meus cursos, o primeiro.

Até ao nascimento das minhas sobrinhas, este foi sem dúvida alguma o dia mais feliz da minha vida.

Lembro-me muito bem daquela manhã de Janeiro de 1999.

Tinha acabado de vir dum fim de ano memorável na neve, tinha retomado o meu primeiro emprego numa fotocopiadora, alguns meses antes entregara e defendera com algum brilho o relatório de estágio, só não obtendo uma nota brilhante porque no ano de 1998 me dedicara a demasiada coisa, incluindo um pouco ao curso, e por isso o brilhantismo que se esperava de mim fora substituído por uma riqueza a nível pessoal que moldou o homem que sou hoje.

Só faltava acabar uma cadeira para finalizar 5 anos de curso, a cadeira mais difícil de todas as quarenta e tal que tivera, e que deixara arrastar desde os fins do 3º ano.

Em Dezembro fora a exame e obtive um salvador 8 que me levava à oral.

Ora como a professora era das duras, a oral não era necessariamente um passaporte para o fim do curso, havia que estudar e bem, havia que me preparar, e eu assim o fiz, apesar do trabalho, dos preparativos do fim de ano, e da tempestade que me invadia, fruto dos ricos acontecimentos desse ano.

Mas estudei, e muito, ao ponto de ter na ponta da língua toda a matéria e, mais necessário do que isso, estar pronto para as variantes dessa matéria, das diferentes leituras que sabia a professora ir apresentar, sendo esse o mais difícil obstáculo, pois nunca ninguém está preparado para o imprevisível…

E eu estava meio…já não me lembro naturalmente da oral em si, sei que a professora não facilitou a coisa, mas que soube estar à altura, numa hora imensa que pareceu um dia, até o momento em que ela me disse que estava tudo terminado, que passara…

A sensação foi maravilhosa, pois além de ter uma vontade louca de beijar a mestre (naturalmente não o fiz por razões por demais óbvias…) nos segundos subconsequentes, passou literalmente à minha frente, não só todos os acontecimentos do curso, mas de uma vida de vinte e tal anos…tudo em segundos, cronologicamente, até ao momento em que ela disse que tudo acabara, aliás, tudo começara, pois uma parte importante da minha vida começaria de facto a partir dali…

E começou de facto, pois, e apesar de só ter trabalhado mais um ano e meio como Assistente Social, tive uma série de empregos noutros domínios, só permitidos pelo meu estatuto de “Técnico Superior”, e eu vivi, namorei, escrevi, chorei e sorri como nunca me lembro até ali, sendo a sensação de que podia ter feito muito mais, mas isso é uma característica intrinsecamente que me leva a ser um eterno insatisfeito com o que alcanço.

Hoje procuro trabalho na área das bibliotecas depois de ter tirado outro curso, preparando-me para em Outubro começar a estudar de novo.

É uma enorme ironia que eu, um amante da escrita, da leitura e da história, procure trabalhar num local onde conjugo tudo isso.

Claro que não há a adrenalina do Serviço Social, das equipas de rua de apoio a toxicodependentes e a doentes com SIDA/AIDS, mas, bolas, já não tenho vinte anos, sendo que essa adrenalina é dispensável, por ser também antropofágica, terrivelmente destruidora, e além do mais, e apesar de ter tido empregos que adorava, este que procuro é de longe o que mais aprecio, por ele em si e pelas imensas perspectivas que ele me proporciona.

Ganhei pois a paz com que lutei durante uma quase-vida, e isso, podem crer que não tem preço, podem crer, e essa paz que julgava impossível de alcançar, começou naquela dia distante de 11 de Janeiro de 1999.

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 11/01/2009
Reeditado em 12/01/2009
Código do texto: T1378521
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