SÓ A MARÍLIA COMPREENDEU:
...por que inesperadamente algo faz surgir um vento novo soprando dentro da gente.
 
 
            O Recanto das Letras é um site de Literatura. Encontrei-o um dia, por acaso. Entrei, visitei, gostei e fiquei. De muitos outros sites visitados acabei saindo por vir a compreender que não combinava comigo. Aqui foi diferente, nem sei de quem é o site, nenhuma informação maior tem, exceto a própria experimentação, de perceber ter tudo a ver com meus interesses e possibilidades. Parece mais ser “Um alguém” tão humano e funcional ou “Uma Escola” que fornece muitas aprendizagens.
            Agora a pouco estava de papo ao telefone com minha filha e percebemos o comportamento diferente entre nós duas. Em sociedade formal, ela tem um comportamento social e, quando sai com as amigas para uma bebida após o trabalho, informalmente, com as mesmas pessoas ela faz farra e todas extravasam alegria e “besteiras”. Ou seja, ficam verdadeiras.
            Surpresa, eu: “É? Pois tenho o mesmo comportamento em qualquer situação e ambiente, seja em sociedade, em trabalho, ou passeio, etc.”           Ou seja, foi um insight para ambas. De modo que, aqui no Recanto das Letras, ocorre uma verdadeira terapia para os leitores e participantes. Ontem quis fazer uma crônica boa e não consegui o resultado desejado. Mas dada a liberdade permitida neste espaço, lancei o meu escrito, que é também um “exercício de ser”.
            Lembrei-me de um insight obtido fora da hora da terapia, quando já voltara pra casa em outubro de 2003. Livre e solta, curtindo aquele momento só meu, no meu lugar. A terapia naquele dia me parecera meio esdrúxula e eu estava bem, ou seja, “não estava nem ai”. Fui pro quartinho e deitei no beliche de baixo e levantando as duas pernas e apoiando as pontas dos pés no estrado de cima, distraída, na paz. De repente:
-Quando o terapeuta me recebeu naquele dia, foi logo mandando, comandando, falando firme e opinião decidida, eu vi que estava na balança ser mandada embora ou, ao contrário, dando-me a chance de continuar a terapia. Fiquei em suspenso nisso. Atendi a ele ler uma carta que eu mandara pra ele em algum outro dia. Ele disse “pensei muito no seu caso e você é controladora, blá, blá, blá, depois foi lá num cartaz na parede que leu e disse que aquilo era muito importante, que ele não atendia a qualquer um, etc, tudo no comando, e eu só aguardando o sim ou o não. na beira de um abismo indeterminado de rejeição, ou ínfima possibilidade de aceitação de mim.
            Agora, ali na caminha, brincando com as pernas estiradas na vertical e cutucando os dedos dos pés no estrado acima, veio a percepção de como ele ficou mais encantador com esta atitude mais pessoal (o terapeuta é superimpessoal, até esqueço como é a fisionomia dele às vezes), expondo, definindo ditando ordens terapêuticas Eu prontamente atendi e paguei do meu empréstimo que acabara de fazer para outras coisas, naquele dia. E o alívio de ser admitida para a terapia de novo foi legal, apaziguante. Sai dali pensando, eu desmontei todos os meus planos de dinheiro pra outras dívidas, etc, mas darei um jeito, agora a terapia continuará normal.
            Mas é interessante que estou considerando insight talvez seja o seguinte: que talvez ele, mesmo terapeuta tarimbado que é, agiu no sentido de zerar de aquela dívida de sessões acumuladas, de significado afetivo e com finalidade de eu me desprender dele, transferência paternal, criança.
            Mas o que está me parecendo é que ele agiu igualzinho minha mãe, pai ou irmãs me mandando sair da sala de visita impiedosamente desconsiderativo para uma criança que eu fora, ou ignorando eu ter fugido de casa o dia inteiro, etc, quando eu era criança, quando tudo que eu queria era participar de tudo, principalmente pessoas humanas, comunicação, curiosidade, participação. Eles me lançavam no ostracismo.
O que estou pensando é que quanto mais rejeitada sou pela pessoa que amo, mais agarrada e dependente desta pessoa, apenas me torna maior importância para eu ser feliz. Talvez esta atitude de familiares me ignorando, menosprezando, me zerando para eles, tenha criado em mim esta carência afetiva deles como condição de eu me sentir bem, completa, e depois desinteressada sadiamente deles, pois a coisa não seria importante como ficou caracterizado em mim.
            Como o Terapeuta agiu com aquela determinação ele ficou o maior charme e encanto e ele estava dando atenção direta e especificamente a mim, Ele não me rejeitou, Ao contrário até. Mas ele fez igual aos meus familiares, ao mesmo tempo, e de propósito terapêutico, possivelmente. Só os terapeutas sabem o que fazem para salvar uma pessoa dos seus problemas.
            A diferença foi que eu senti mais encantamento e compreensão com ele e, ao mesmo tempo, uma libertação de precisar que ele gostasse de mim. Foi um grande aprendizado que vale em minha vida desde sempre. Ele me fez grande bem.
            Antes dessa terapia, quando cheguei a Frankfurt, (uma viagem presente de minha filha quando ela lá estava), ela me esperava no aeroporto com tulipas para mim em suas mãos. Era surreal! Difícil de acreditar! E ela foi cuidadosa de me adoçar amor sem me assustar, pois eu nunca iria acreditar que ela me amava simplesmente (no fundo já via naquela atitude dela, uma expiação de algum sentimento de culpa: eu precisava mesmo de terapia!). Não era nada disso e filhos, fazem terapia na gente também, às vezes eles sabem muito mais do que a gente pensa.
            E ela se atirou em meus braços e eu me entreguei em seus braços. E foi maravilhoso. E para ela também. E eu nem fico com saudade demais dela, depois disso ficamos numa boa e nenhum filho está mais perto que ela, quando estava a 10.000 km de distância. Mesmo sem telefone ela é que está mais próxima de mim, e em quem menos penso ou preocupo.
            E depois dessa experiência eu concluo que sou e me comporto a mesma coisa com qualquer pessoa, em qualquer lugar e situação. Chamo doutor de você com todo respeito, mas beijo e abraço se gosto e, uma atitude sincera e verdadeira vale para toda gente e pra qualquer situação. Conto tais coisas porque pode servir para alguém menos atento a si próprio.
            E ontem, só a Marília compreendeu.