O banheiro

O banheiro é um santo lugar. Onde reina o silêncio e nós podemos ser nós mesmos. Não me refiro a banheiros de rodoviária, shoppings ou outros lugares movimentados onde o banheiro é coletivo. Nesses lugares o banheiro é cultural e esportivo, não santo. È fato que porta de banheiros públicos pode chega a ser campo de batalha entre crenças, a exemplo de quando um ateu escreve “Jesus não existe”, e o crente, sentado em seu trono, percebe a heresia, procura por uma caneta mas não encontra, termina o serviço, aperta o botão da descarga e sai dali indignado. No outro dia, não usa o banheiro de casa, volta no mesmo shopping, no mesmo banheiro e procura, entre a dezesseis portas, a mesma que tinha usado no dia anterior, tenta abrir a porta mas está fechada, tem alguém ali, espera... espera... “Nossa esse cara tá soltando um caminhão basculante ai no vaso”, pensa. O rapaz sai, o outro entra, cobre o nariz com a camiseta, senta no vaso, saca do bolso uma caneta, risca a heresia e escreve: “Jesus Salva”.

É também possível acompanhar a guerra entre torcidas de times de futebol que se agridem mutuamente nesse painel de informações que é a porta do banheiro masculino. Tanta informação que chega a ser cultural. Li uma vez (não em porta de banheiro) que uma socióloga escreveu um livro onde apontava características marcantes de cada sociedade de acordo com os recadinhos deixados no banheiro. Deve ter sido um trabalho árduo; junto com a observação das mensagens vem a observação involuntária do cheiro, da sujeira...

O banheiro também é um lugar perfeito para leitura. Eu mesmo só consigo “funcionar” lendo alguma coisa. Acho que fiquei condicionado. Normalmente o melhor é um artigo, tipo os do Diogo Mainardi, da veja, pois se o texto for ruim é só olhar para a fotinha dele que solta o intestino na hora. Crônicas servem, porque o tempo é perfeito, você faz o serviço e termina a leitura. Duas atividades simultâneas.

O banheiro é um universo paralelo. Todos sabem disso. Nada pior do que você estar sentado no santo trono e vir alguém e girar a maçaneta bruscamente tentando abrir a porta, como diz minha avó Clarice “chega à corta o grosso”. É uma falta de respeito indizível. Nos casos de dúvida, deve-se esperar do lado de fora e dar batidinhas leves, suaves na porta e dizer suavemente, quase sussurrando, como se estivesse acordando alguém, a frase: “Tem alguém aí?”. Nunca, jamais, chegue girando a maçaneta.

Um acontecimento inédito na humanidade é a aparição de Santos nos banheiros. Não ouvi dizer até hoje de alguém estar prestes a tentar suicídio no banheiro e de repente ter uma visão de São Jonas dentro do vaso. Lá eles não aparecem, não adianta rezar, orar, clamar... Banheiro é banheiro. Um lugar a ser respeitado. Até os santos sabem.

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STATUS AUSENTE: Zebedias foi ao banheiro.