CADA UM TEM O SEU BECO PRA ESPIAR
Quando cheguei aqui na praia, no dia 31, a primeira coisa que observei ao olhar para o céu da varanda da casa foi uma pipa em forma de águia, que planava por cima dos coqueiros e sobre a casa do meu sobrinho OTTO, que fica em frente a nossa. Ninguém a empinava, estava presa num galho de árvore.Daí passei a observá-la sempre que deitava numa reda na varanda. Divertia-me em seguir os seus movimentos, sua elegância, ora tomando altura, ora embicando, sumindo e aparecendo logo em seguida. Mas hoje cedinho caiu uma chuva fina e eu que ainda estava deitada lembrei da pipa, levantei, abri a janela da frente, olhei pro céu, mas a pipa lá não estava. Ai pensei comigo mesma: que droga! por que uma chuva tão fina e tão pouca conseguiu atingir a pipa e derrubá_la!? Atingiu... derrubou ...e era só uma chuva fina... Então, eu que também li o "Caçador de Pipas", lembrei de Amir, que se viu espantado ao ver como o seu baba podia atingi-lo com poucas palavras. Se perto de mim estivesse o então menino , eu teria dito : mas isto acontece, Amir, poucas palavras podem derrubar uma criatura, principalmente, quando ditas por aqueles que nos são caros, que fazem parte de nossas vidas e de qualquer jeito do nosso passado, porque passado, bem diz você, Amir, que essa história de que podemos enterrá-lo não é verdade, de um jeito ou de outro ele sempre consegue escapar. É como se cada um tivesse o seu próprio beco (sem saída) para espiar.