Alguém de muito bom gosto
Aqueles que, como eu, têm "mais primaveras" do que gostariam de admitir mas que só por usar essa expressão enrugada já entregam o ouro, com algum esforço e todo o cuidado vão se lembrar de um programa semanal que havia na TV Record: Esta Noite se Improvisa.
(lembra-me agora a minha filha, que há um programa do Silvio Santos que deve ser cópia daquele. Afinal, quase nada se cria, muito se copia..)
Pedindo desculpas pelo cheiro de naftalina: Eram escalados os cantores do elenco para, a partir de uma palavra, lembrarem trechos de músicas. Foi nele que se projetaram de vez pelo menos dois novatos que dominavam em revezamento todos os programas e que a direção, sabiamente, não os colocava juntos para ir criando um certo clima de expectativa para a "final do século", que nunca veio.
Um deles era uma figura suave, irmão da cantora de "Carcará" , um sorriso às vezes meio fora de hora, que chegava com as mãos nos bolsos, camisa gola rolê (ainda existe?), praticamente pedindo licença intimidado pelos outros cinco colegas de programa a quem, imaginávamos, tinha acabado de pedir autógrafos nos bastidores. Ele, sem graça e sem saber direito onde estava, conquistava com seu jeito de primo chegado do interior. E sabia tudo. Talvez até deixasse passar uma ou outra palavra apenas para manter aquela aura cativante de humildade.
O outro, também pagando prá não aparecer, nem precisaria cantar pois o que se discutia era se os seus olhos eram verdes ou azuis. Se era filho ou sobrinho daquele intelectual famoso. Se a sua formação era em arquitetura ou medicina. Se o pequeno príncipe era mesmo ele ou não. Era irritantemente bonito e, como se isso fosse pouco, tímido também. Ar de bom moço e sonho de genro para 11 entre 10 mães de mocinhas. E conhecia música tanto como o seu "rival".
Esses dois campeões nunca se encontravam. Só muitos anos depois fizeram um programa juntos por alguns meses , onde também estiveram Pablo Milanés, Tom Jobim, Mercedes Sosa, Astor Piazzolla... Precisa mais?
O outrora menino hesitante agora era êxito inconteste em textos londrinos no Pasquim, cabelo encaracolado e irreverentes agitações tropicais, frases e atitudes ambíguas mas, principalmente, músicas geniais. Melhor cantor Brasileiro até hoje.
O agora amigo, então futuro genro preferido do país, maior poeta da música Brasileira, legítima unanimidade nacional, arauto autêntico de causas sociais, inteligente e lúcido intelectual sem aspas, conseguiu substituir gradualmente a aparência externa por uma crescente beleza interior, que aflora em músicas, livros e atitudes.
Num desses muitos 2 de Janeiro que já vencí, ganhei de presente:
Chico & Caetano, Juntos e ao Vivo
"Você não entende nada" de Caetano emendando com "Cotidiano" do Chico, cantadas pelos dois de uma forma muito original que quase faz acreditar que foram feitas como uma só música já vale a pena tentar encontrar por aí esse CD, mas tem muito mais:
Quando eu chego em casa nada me consola
Você está sempre aflita
Lágrimas nos olhos de cortar cebola
Você é tão bonita...
Traz meu café com suita, eu tomo
Bota a sobremesa, eu como
Eu como Você...
Você tem que saber que eu quero correr mundo, correr perigo
E quero que Você venha comigo.
Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode as 6 horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã...
Toda noite ela diz prá eu não me afastar
Meia-noite me jura eterno amor
E me aperta prá eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor.
Quem escolheu esse disco tem muito bom gosto. Houve quem questionasse essa qualidade nela, por haver me escolhido também...
Aqueles que, como eu, têm "mais primaveras" do que gostariam de admitir mas que só por usar essa expressão enrugada já entregam o ouro, com algum esforço e todo o cuidado vão se lembrar de um programa semanal que havia na TV Record: Esta Noite se Improvisa.
(lembra-me agora a minha filha, que há um programa do Silvio Santos que deve ser cópia daquele. Afinal, quase nada se cria, muito se copia..)
Pedindo desculpas pelo cheiro de naftalina: Eram escalados os cantores do elenco para, a partir de uma palavra, lembrarem trechos de músicas. Foi nele que se projetaram de vez pelo menos dois novatos que dominavam em revezamento todos os programas e que a direção, sabiamente, não os colocava juntos para ir criando um certo clima de expectativa para a "final do século", que nunca veio.
Um deles era uma figura suave, irmão da cantora de "Carcará" , um sorriso às vezes meio fora de hora, que chegava com as mãos nos bolsos, camisa gola rolê (ainda existe?), praticamente pedindo licença intimidado pelos outros cinco colegas de programa a quem, imaginávamos, tinha acabado de pedir autógrafos nos bastidores. Ele, sem graça e sem saber direito onde estava, conquistava com seu jeito de primo chegado do interior. E sabia tudo. Talvez até deixasse passar uma ou outra palavra apenas para manter aquela aura cativante de humildade.
O outro, também pagando prá não aparecer, nem precisaria cantar pois o que se discutia era se os seus olhos eram verdes ou azuis. Se era filho ou sobrinho daquele intelectual famoso. Se a sua formação era em arquitetura ou medicina. Se o pequeno príncipe era mesmo ele ou não. Era irritantemente bonito e, como se isso fosse pouco, tímido também. Ar de bom moço e sonho de genro para 11 entre 10 mães de mocinhas. E conhecia música tanto como o seu "rival".
Esses dois campeões nunca se encontravam. Só muitos anos depois fizeram um programa juntos por alguns meses , onde também estiveram Pablo Milanés, Tom Jobim, Mercedes Sosa, Astor Piazzolla... Precisa mais?
O outrora menino hesitante agora era êxito inconteste em textos londrinos no Pasquim, cabelo encaracolado e irreverentes agitações tropicais, frases e atitudes ambíguas mas, principalmente, músicas geniais. Melhor cantor Brasileiro até hoje.
O agora amigo, então futuro genro preferido do país, maior poeta da música Brasileira, legítima unanimidade nacional, arauto autêntico de causas sociais, inteligente e lúcido intelectual sem aspas, conseguiu substituir gradualmente a aparência externa por uma crescente beleza interior, que aflora em músicas, livros e atitudes.
Num desses muitos 2 de Janeiro que já vencí, ganhei de presente:
Chico & Caetano, Juntos e ao Vivo
"Você não entende nada" de Caetano emendando com "Cotidiano" do Chico, cantadas pelos dois de uma forma muito original que quase faz acreditar que foram feitas como uma só música já vale a pena tentar encontrar por aí esse CD, mas tem muito mais:
Quando eu chego em casa nada me consola
Você está sempre aflita
Lágrimas nos olhos de cortar cebola
Você é tão bonita...
Traz meu café com suita, eu tomo
Bota a sobremesa, eu como
Eu como Você...
Você tem que saber que eu quero correr mundo, correr perigo
E quero que Você venha comigo.
Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode as 6 horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã...
Toda noite ela diz prá eu não me afastar
Meia-noite me jura eterno amor
E me aperta prá eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor.
Quem escolheu esse disco tem muito bom gosto. Houve quem questionasse essa qualidade nela, por haver me escolhido também...