Logo após a decolagem, uma das aeromoças, segurando uma cestinha cheia de bombons, passou pelo corredor distribuindo as balinhas com gordura trans já velhas conhecidas nossas. Ela sorria toda afetada esperando que os passageiros interessados na guloseima metessem a mão na cesta e tirassem sua porção. E lá se iam as mãos da maioria se atropelando quando ela estirava as balinhas em meio às pessoas afiveladas aos assentos. Parecia um bailado de dedos afundando por entre os docinhos enrolados em papéis coloridos.



Depois, o sossego se podemos cognominar assim o interlúdio da viagem, que durou cerca de três horas num céu de brigadeiro. O céu, escuro e solitário, passava a imagem de mistério e silêncio. Vi diversos passageiros dormindo de boca aberta e roncando, mas eu mesmo não consegui pregar os olhos um só instante. Nem Ana. Conversávamos, ríamos, líamos as revistas e deixamos o tempo fluir até, finalmente, já sobre o espaço aéreo de São Paulo, testemunhamos o nascer dos primeiros traços de luz solar ainda incipientes riscando o espaço por entre as nuvens ralas e dando à paisagem difusa um grandioso ar de aquarela sendo pintada por mãos peritas no assunto. Cada pincelada colorida acrescentada deixava entrever a grandiosidade e o esplendor da aurora vislumbrada acima das nuvens, o seu impacto sobre nossas emoções, a beleza de sua mágica fascinação. Depois, como gran finalle, a magnitude do sol arredondando-se majestoso e formando o seu império estelar à medida que o dia abria os olhos e se retorcia de preguiça para reiniciar a rotina da vida em nossa Via Láctea. Quando pousamos no aeroporto de Guarulhos o amanhecer sorria feliz com as dezenas de fotos que tiramos a dois mil metros de altura. O sol, então, mostrou-se todo faceiro e petulante fazendo poses para nossos instantâneos. A primeira etapa de nossa viagem estava concluída.



Restava, como de fato assim ocorreu, enfrentar o congestionamento no corredor do avião, esperar a abertura da porta na despressurização da aeronave e, lentamente, na balbúrdia das bagagens sendo retiradas do compartimento acima de nós, descer as escadas e correr para os ônibus que nos transportaram até o salão de desembarque ou, como era o nosso caso, adentrar o corredor que levava à conexão para o reembarque sofrendo a tortura de ter que tirar casado, celular, bagagem de mão, moedas e outras bugigangas para não ser barrado pelo detector de metal. Em determinada ocasião, uma mulher quase tirou a roupa por causa da sirene tocando todas as vezes que ela tentava ultrapassar o detector. Muitas vezes o problema é causado por alguma moeda renitente escondida no fundo do bolso ou em qualquer lugar esquecido da roupa.



Bom, conseguimos ultrapassar mais esse obstáculo e fomos para a última e ampla sala de espera da viagem, um espaçoso e comprido corredor a perder de vista. Eram em torno de sete horas da manhã e já estava mais que na hora do desjejum. Ali mesmo havia uma lanchonete, fomos servidos, pagamos e nos aboletamos para a espera até sermos chamados ao embarque no avião para Curitiba. Mas não nos acomodamos o tempo todo, caminhamos para lá e para cá, fotografamos à beça, acessamos a internet via notebook e, quando menos demos por isso, uma voz impessoal no alto-falante anunciou que era nossa vez de embarcar.
Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 20/12/2008
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