AS CHUVAS DE ABRIL
Todos os anos, quando chega o mês de abril e inicia a estação das chuvas, lembro-me mais dela, de sua coragem, de como ela enfrento todos aqueles percalços, todo aquele sofrimento, quando assistiu seus três filhos serem executados, sendo que o mais velho tinha apenas 13 anos, e ela foi estuprada durante mais de 7 horas seguidas, por mais de 10 homens, até que cada um deles tivesse saciado sua sanha diabólica.
Para completar este quadro dantesco um deles deu-lhe um tiro na cabeça, e jogaram seu corpo junto de outros cadáveres
em uma vala comum, onde seriam, no dia seguinte, queimados e
enterrados.
E eu ali parado sem nada poder fazer, fui poupado por ser cego.
À noite esgueirei-me por entre centenas de mortos e Deus per-
mitiu que a encontrasse, ainda respirando.
Peguei-a e a levei para o único lugar que julgava seguro, na Igreja de São Patrício. Bati à porta, chamei, implorei por ajuda, mas ninguém atendeu.. Então deixei-a ali na entrada , semi-morta,
estirada no chão. Afastei-me lentamente dali, e nunca mais a vi ou
ouvi falar dela.
Por isso a cada mês de abril minh’alma se enche de um vazio tão intenso, que nem sei como ainda agüento.
Estou numa espécie de asilo, não sei bem porque, mas meus cabelos devem estar brancos, pois conto minha vida pelos meses de abril, quando ouço as chuvas chegando.
Marco Orsi