UMA LINDA MULHER!
UMA LINDA MULHER!
Nelson Marzullo Tangerini
Não, amigos, não estou falando de um filme estrelado por Julia Roberts e Richard Gere; mas sobre Uma Linda Mulher que conheci há alguns anos, numa movimentada rua do Rio de Janeiro, e que vem me perturbando o sono.
Há muito deixei de ser poeta – a fonte inspiradora secou, não tenho mais sonhos -, passei a ser o frio cronista que vos escreve; o simples cidadão do mundo que observa o ruído das ruas de nosso planeta.
Vivo, porém, ultimamente, a contemplar o rosto da mulher amada, como se estivesse diante da Mona Lisa. De súbito, o amor me toca, põe em minh´alma sua porção mágica. Não lhes diria uma só palavra se por dentro de mim não incendiasse essa chama que me queima o peito e me inquieta diante de uma folha de papel em branco.
Se fosse “O Poetinha” Vinícius de Moraes, faria mil versos de amor - para que ela me percebesse, para que ela caísse no meu laço, no meu abraço, no meu amasso, para que ela fosse a minha namorada.
Apaixonado e atordoado com a sua beleza, eu poderia entrar agora num bar e beber todas – por sua causa.
Não, não farei isto. Não sou romântico. Prefiro embriagar-me de sua beleza, estampada em suas fotografias.
Ela é realmente muito bonita e está rodeada de flores, num mundo de segredos e mistérios – prato cheio para um poeta simbolista.
Um poeta romântico a idealizaria como a musa inatingível, inalcançável.
Vivemos na mesma cidade e estamos distantes e isto me leva a invadir a produção romântica daqueles poetas que morriam jovens – de tuberculose.
Ela tem meu telefone. Por que não me liga? Por que não encurta este espaço que existe entre nós?
Percebi seu rosto e seus cabelos no exato momento em que a conheci. Buzinas e freadas de ônibus e carros e vozes mil não me impediram de ouvir e contemplar sua fala mansa e mágica.
Por um tempo, perdi-a de vista. Pensei nunca mais tornar a vê-la. “Quem ama é capaz de ouvir e entender estrelas”. Pois bem, ouvi estrelas, quase plagiei Bilac, mas não perdi o senso. E, para minha felicidade, vi-a, recentemente - mais linda e mais cândida e casta.
Direis agora: - Tresloucado amigo, não tens a mínima chance de conquistá-la. Olha-te no espelho. És um mísero e reles rabiscador de papéis. És feio, barrigudo, calvo e míope. Tens uns óculos de armação preta e horrorosos no meio das fuças. A miopia te impede de ver a realidade, poeta.
A realidade, aqui, citada pelo nosso nobre amigo, - leia-se -, é a total ausência de sentimentalismo, do romantismo piegas, que levou muitos poetas românticos a estudarem mais cedo “a geologia dos campos-santos”. É o fruto, talvez, das leituras e releituras de Machado de Assis e Eça de Queiroz. Ou, mais recente, de Nelson Rodrigues.
Como sonhar não é ainda proibido, e não se lê o que anda estampado no cérebro e no coração do outro, vivo a sonhar apaixonadamente com esta deidade que perturba o meu sono.
Não direi seu nome, não direi onde mora, nem direi onde trabalha. Não quero expô-la. Longe de mim, incomodá-la em seu castelo na montanha ou nas suas horas de labuta. Ela lerá, descompromissadamente, por certo, esta minha crônica, um dia desses, e saberá que este velho e chato escritor lhe dedicou algumas pobres linhas.
Graciosa e bela, a minha musa me fez sonhar, deu sal à minha vida, me fez estar aqui, neste momento, falando baixinho, falando de amor, esquecendo até do futebol, ouvindo e plagiando O Poetinha, escrevendo essas tolices.
Plagiando o poeta português Fernando Pessoa, só as pessoas ridículas nunca escreveram poesias, crônicas e cartas de amor.
Nelson Marzullo Tangerini, 53 anos, é escritor, jornalista, poeta, compositor, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 Nestor Tangerini.
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