AMOR DA ROÇA
Não quero fazer minhas, as histórias dos outros, porém não poderia deixar de escrevê-las pelo desleixo de seus donos. Como bom espectador as - ouço e como médio escritor as publico.
Numa dessas noites chuvosas de sábado, nada havia para se fazer a não ser ouvir as histórias de Seu Olavo. Seu Olavo é um desses senhores falantes amantes de futebol, cerveja e de uma boa prosa. Nunca entrou numa escola, sabe o português falado na roça. E sem delongas ele me disse:
-Sabe essa velha que aí está, não foi fácil conquistar sua mão. Lembro bem do sufoco que passei. Namorávamos já há algum tempo às escondidas, porém essa história de nos encontrar no cafezal já tinha passado das contas. Certo dia num de nossos encontros eu decidi que iria falar com o senhor seu pai. Ela desesperada tentou me convencer do contrário, afinal seu pai era nortista e já havia botado três “cabras” pra correr pelo mesmo motivo. O desafio me motivou a continuar, disse sem rodeio: -Eu vou e acabou a conversa!
Voltei a minha casa peguei uma garrucha com nove tiros e botei na cinta. Cheguei até cozinha e avisei minha mãe.; -Eu vou pedir hoje a Cacilda em casamento pro pai dela, porém eu não me responsabilizo do que possa acontecer depois disso. O velho é “brabo” e eu sou doido!. Selei o Gaúcho (meu cavalo amarelo), tomei um banho e esperei o sol se esconder. Da fazenda que eu morava podia se avistar a casa de Cacilda (que ficava na fazenda vizinha). Logo pude ver sua mãe acendendo o lampião e o velho sentado numa cadeira na varanda.
Decidi que era a hora de agir. Subi no “Gaúcho” e toquei pra sua fazenda; Eu, a garrucha e a coragem. Chegando à porteira, Cacilda tentou me impedir outra vez, mas já era tarde, a única coisa que restou a ela foi correr desesperada para se esconder na casa. Quanto mais eu me aproximava da varanda, mais minhas pernas tremiam. Antes de avistar o velho nortista, enxerguei ao longe seu facão que roçava o chão enquanto sentava em sua cadeira. Cheguei de supetão e fui logo falando: -Queria falar com o Senhor.
- Creio que vosmecê deve de ter algo de muito importante pra me falar, pois a hora já “tardeia” e meu sono não aceita amolação.
- Tenho sim senhor. Vim lhe pedir a mão de sua filha em casamento, pois sou rapaz trabalhador e não tenho intenção de ficar de namorico sem aliança. -Neste momento ele acariciou a bainha de seu facão e levantou vagarosamente. Sua esposa saiu de dentro da cozinha num grito só exclamou:
Olhe Zé, há muito tempo que eu não vejo um alguém falar com tamanha firmeza, nem mesmo vosmecê que tem o sangue esquentado no dia em que falou com painho, foi tão corajoso quanto este moço. Eu aprovo pela coragem.
- Mas Maria, entre pra dentro e lá fique. Aqui é assunto de homem!
Meu Rapaz, disse ele , nós estamos tratando de algo muito sério e minha filha precisa dizer se é do querer dela também. Cacilda! Gritou o velho.
-Senhor, disse Cacilda envergonhada.
-É de sua vontade casar com esse sujeito.
-É sim senhor meu pai.
-Pois bem, então trate logo de combinar a data, pois não quero ninguém queimando querosene até tarde em minha casa.
-De jeito maneira! Vou respeitar a luz do sol e com a certeza dessa lua que nos assiste, de hoje à sessenta dias levarei sua filha ao altar. Falei aliviado.
-Pois bem se assim é, Maria borá fazer um café!
E assim terminou minha matança, nem garrucha, nem facão e nem bofete. Apenas Cacilda que hoje tanto me amola
samuel@limao.com.br