Perdas e Ganhos

A história não se repete, os momentos são únicos. Nós humanos, conseguimos desenvolver, no entanto, uma capacidade igualmente impar; reviver os momentos mais significativos de nossas vidas. Esta competência se dá graças a memória, ela ( a memória) é responsável por não precisarmos aprender diariamente as tarefas de se vestir, escovar os dentes, pentear os cabelos, amarrar os cadarços, etc. Os hábitos que possuímos só são possíveis devido a memória, ela registra todas as nossas ações, as que nos dão prazer e as que nos causam desconforto.

Quando somos submetidos a situações prazerosas, desejamos repeti-las e repeti-las por várias e várias vezes, com o tempo tais comportamentos podem virar hábitos, os hábitos por sua vez podem ter vínculos de prazer ou desprazer. O vínculo que se estabelece com um pudim de leite, ou com uma torta de nozes, não é o mesmo que se obtém com uma pessoa.

Adquirimos o hábito de tomar cafezinhos, cervejinhas, de fazer caminhadas, mas o modo como nos vinculamos aos outros difere totalmente destes hábitos. No primeiro caso, o prazer está relacionado a satisfação do sistema de saciedade, influencias ideológicas, ou ainda preferências subjetivas. Já no segundo caso, trata-se de afetividades e sexualidade, significa dizer que nos ligamos aos outros pelo mesmo mecanismo (prazer/desprazer), mas por sentidos distintos.

Quando se perde alguém, uma pessoa amada, por exemplo, é comum um comportamento que ainda considere a presença de quem já se foi. Isto pode ser confirmado nos relatos daqueles que perderam seus entes queridos, são viúvas, órfãos, casais que se desquitaram, etc. As pessoas que sofrem tais perdas sentam na varanda à espera de quem não vai mais voltar, preparam o café no horário e do modo como o outro gostava, arrumam os pertences do outro como se ainda os fossem usar, enchem o carrinho do supermercado com as coisas que outro gostava, em fim, pensam e agem como se não estivessem a sós.

As lembranças, muitas delas doloridas, passam a fazer referência à realidade, pois a cada vez que se busca lembrar dos gestos, dos gostos, das manias do outro, nos despertamos para sua ausência. Lembrar das músicas preferidas, daquilo que era seu hobby, o modo como olhava, falava, as frases marcantes, tudo isto são meio de manter o ausente, presente entre nós. Lembramos de suas idiotices e teimosias sem sequer sentir raiva, pelo contrário, agora é até possível rir saudosamente. Alguns com dificuldades de aceitar a ausência do outro, chegam ao ponto de por meios metafísicos tentar estabelecer alguma comunicação com aqueles que partiram, tais comportamentos são reflexos da nossa dificuldade em lidar com as perdas.

A presença da pessoa ausente se assemelha a alguns processos psicológicos, como é o caso de uma amputação, segundo alguns relatos, é possível sentir e agir por um determinado tempo após a retirada de um membro, como se este ainda estivesse conectado a nós. Nosso cérebro precisa de tempo para se habituar com a ausência daquilo que fez parte de nós por longas datas, no caso de um ente querido este tempo pode ser indeterminado.

A perda sempre é perda e só se converterá em ganho se nos dispusermos a superá-la, superar a perda de alguém é um processo, trata-se antes de qualquer coisa de uma caminhada onde a cada passo que damos nos tornamos mais e mais confiantes de que a vida tem que continuar, apesar de tudo.

Jonatas Carlos de Carvalho

histosofiaevida.blogspot.com

J Carval
Enviado por J Carval em 13/12/2008
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