ESTILHAÇO V - O mosaico de Karol Bauer
Natal a aproximar-se. Meus livros na estante. Não iria escrever mais no Recanto. Desculpem-me, estou levemente embriagada pela cidra que estou tomando... Meus livros na estante são os únicos companheiros estimulantes, além da bebida... Estou chorando... Geralmente subestimo meus Kafkas e Falkners... Eles me amedrontam. O natal me amedronta... Desculpas... Desde um específico natal, o vazio enche-me de solidão e tédio. Esvaziei-me há tempos de sentido natalino... Eu quero ser o débil mental de O Som E A Fúria, eu não quero ser ninguém... Minha mãe está morta... As tias de quem eu gostava, suponho que, pela idade, estão mortas... Amigos, se algum dia existiram... Desculpem-me, ainda choro... Meu filho é a lágrima mais preciosa, a lágrima que até hoje não voltou... Estará vivo? Estará com fome? Pó que não me visita com sua forma natural? Só em forma de lágrima... A cidra está no fim... Os netos, não sei se os tenho... Meu pai, quem dera morrer em minhas lembranças... Pai vivíssimo, dor vivíssima... Dói saber que mamãe não pode mais enviar-me um cartão... Apenas livros, meus livros... Eles não me abandonam... Um dia eu os abandonarei... Derramei a cidra sobre o teclado... Eles hão de reverenciar a data por mim, quando eu me for... Hão de fazer uma última oração... Meus livros, porque só eles existem, o natal não existe mais. Só um seco antinatal.