O prazer é todo seu. Maria Mal-Amada

Crônica extraída do livro Maria Mal-Amada

de Lorena de Macedo

Então você me quer. Cada fio de cabelo e cada linha de expressão só pra você. Quer me sugar até sobrar apenas o bagaço de gente. Você me quer pelo que pode ser para mim. Quer se afirmar enquanto eu torço para cair em cima de você com toda a minha deselegância.

Então você sabe esperar. Supõe que me mimar com carinhos previsíveis vai facilitar as coisas. Está coberto de razão. Adoro a falta de surpresa do buquê de flores enviado no dia do aniversário. O cartão traz sempre a mesma mensagem desprovida de qualquer senso de criatividade.

Desculpe a falta de jeito, mas estou maravilhada pelo seu desejo por mim que chego a desconfiar de tanta bajulação. Sabe como é, calejada pelos anos de se enxerga margarida fazem isso com qualquer um. Incrédula com qualquer tipo de sorriso. Não acreditei nos seus primeiros quinze sorrisos amarelados, mas agora já deu para perceber que você não está de brincadeira.

Vamos fazer o seguinte: Mostro os bilhetes desaforados que escrevo para mim mesma e você me diz se vale a pena me dar atenção. Quase todos pregados na porta da geladeira na inútil sensação de me sentir mais cheia.

Não vá sumir de repente. Não quero ter que descobrir o telefone da sua mãe e inventar uma desculpa aceitável para ligar atrás de você. Ligar na casa da mãe é um sinal de alerta. Deixo você correr de mim se eu fizer isso.

Então você sabe convencer. Língua afiada com traços de discurso ensaiado enquanto eu acredito que finalmente tenho alguém para me esperar na porta do provador feminino. Sempre trombo com namorados babões a espera das felizes donzelas que experimentam a loja inteira. Para cada peça, um desfile com platéia na porta.

Descobri que você também sabe correr, mesmo sem a ligação para a mãe. Sem motivo aparente, sem bagaço de gente. Só fica o porquê de mais um e menos eu mais uma vez. Menos manhãs bem humoradas, menos sorrisos espontâneos, menos de mim para o resto do meu mundo que merecia mais porque não correu como você.

Meu mundo não corre de mim, mas corre do resto do mundo de todas as outras pessoas. Corre, porque se andar vagaroso e sem vontade alguém pode agarrá-lo e nunca mais soltar.

Você sabe convencer, esperar e correr, mas é só. Muito pouco ou quase nada. Sabe se esconder na multidão e passar despercebido como qualquer um. Então eu descobri que não preciso convencer. Sou mais do que qualquer coisa despercebida na multidão. Sou mais eu e o azar é todo seu.

O prazer também.

Maria