TAMBÉM SOMOS RESPONSÁVEIS?

Terremoto na Califórnia. Tsunami na Ásia. Furação em Santa Catarina. Seca no sul. Inundação no nordeste.

Eu fico assustado toda vez que assisto ao jornal.

Parece que como se já não bastassem todos os problemas do dia-a-dia, a mãe natureza também resolveu nos dar uma lição.

Tenho a impressão de que após tantos anos de agressão a terra se cansou e está nos dando um ultimato: Ou mudamos nosso comportamento ou com uma sacudidela ela se livra de nós, como se fossemos pulgas em um cachorro.

Tal cansaço não é pra menos, durante o último século a humanidade abusou mais da natureza, explorou mais recursos naturais e poluiu mais do que nos 10.000 anos anteriores.

É o custo do progresso, dirão alguns. Pode até ser, entretanto para progredirmos é necessário que ao menos continuemos a existir.

Uns culpam os governos, alguns as empresas, mas poucos assumem que tem a sua parcela de responsabilidade em toda a degradação que vem acontecendo.

Assim, se observarmos com atenção certamente encontraremos o nosso quinhão de culpa escondido nas pequenas coisas que podemos fazer ou deixar de fazer em nosso cotidiano.

Outro dia, em uma loja, ouvi uma garota comentando com a outra que o seu celular estava velho e feio e que estava na hora de trocá-lo.

A outra garota respondeu: “Também, já faz seis meses que você o comprou!”

Pronto, inventamos uma nova forma de obsolescência, que não é mais funcional ou de utilidade, mas meramente estética. Por um lado isso é bom, dá emprego aos designers, aos operários, aos vendedores, faz com que as ações das empresas subam, enfim ajuda a impulsionar a economia.

Todavia, por outro lado, para se fabricar cada bela caixinha de plástico, metal e silício daquelas são necessários vários litros de petróleo e a prévia exploração de várias toneladas de minérios para a extração de ouro, cobre e semicondutores, usados na fabricação dos microchips, aquelas pecinhas eletrônicas que parecem pequenas baratas e que são a alma dos celulares.

Mais precisamente, segundo um estudo publicado pelo "Journal of Environmental Science and Technology”, em sua fabricação são consumidos em média 1,6 quilos de combustível fóssil, 32 quilos de água, além de 72 gramas de produtos químicos, que com certeza foram extraídos a fórceps das entranhas da terra.

E, olhe que cada aparelho precisa de vários daqueles insetos de metal para funcionar.

Não esqueçamos, é claro, do plástico das carcaças e dos metais pesados das baterias.

Agora, façamos um exercício de imaginação e vamos projetar o comportamento das duas garotas em uma escala bem mais perturbadora.

Só no Brasil estima-se que em 2010, teremos 170 milhões de aparelhos ativos. Se desses milhões de donos de celulares, apenas 20% acharem que seus aparelhos ficaram feios e resolverem trocá-los a cada seis meses, então descartaremos no lixo por ano, 68 milhões de pedaços de detritos altamente poluidores, totalmente fabricados com recursos que não são renováveis e que raramente tem um destino adequado, pois na maioria das vezes acabam no leito dos rios, onde bebemos água, ou no solo de onde tiramos o que comer.

Eu não sou contra os celulares, pelo contrário acho que eles são aparelhos extremamente úteis e que revolucionaram as comunicações na última década.

Também não me oponho ao fato das pessoas desejarem sempre o melhor, mas entendo que devemos estar informados sobre o custo duplo dessa troca para o planeta, que irá fornecer matéria-prima para o novo e belo aparelhinho e ainda terá que decompor o velho. Então, se de posse dessas informações mesmo assim resolvermos trocar um telefone com garantia de no mínimo 01 ano em apenas 06 meses só porque ele está esteticamente obsoleto, vamos em frente!

Agora, convenhamos talvez tal atitude seja individualmente apenas frívola, porém coletivamente, em longo prazo, certamente ela será desastrosa.

Posso até estar sendo pessimista. É possível que todos esses 68 milhões de aparelhos sejam reciclados, pois algum interesse econômico em desmanchá-los certamente existe.

Recentemente assisti a uma reportagem onde se alegava que para se extrair cinco gramas de ouro de uma mina é necessária uma tonelada de minério, enquanto para se conseguir a mesma quantidade do vil metal da sucata de equipamentos eletrônicos descartados são necessários apenas alguns quilos de microchips. Ora, com 68 milhões de celulares por aí, talvez tenhamos uma nova serra pelada.

É possível que eu esteja falando besteira e alguém certamente irá dizer: “Ora, esse sujeito está completamente maluco se acha que pelo simples fato de deixar de trocar o meu celular este ano eu estarei salvando o planeta!”

Pode até ser, mas não sei o porquê, acabo de me lembrar daquela fábula do passarinho que questionado sobre a utilidade de sua tentativa de apagar um incêndio trazendo uma gota de água em seu bico respondeu: “Ao menos estou fazendo a minha parte!”

Apenas no Brasil somos quase 200 milhões de bicos é mais do que o suficiente para fazer alguma diferença.

ISRAEL DE PAULA LOPES
Enviado por ISRAEL DE PAULA LOPES em 10/12/2008
Código do texto: T1327702
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