SCHOPENHAUER E O FUTEBOL
Ninguém merece domingo com final de campeonato brasileiro. Não suporto toda agitação, todo frenesi que o futebol provoca. Toda esta agitação por quê? Aquela gritaria, aqueles idiotas que entram num carro e saem buzinando pela cidade. As torcidas (des) organizadas que disseminam violência e tudo o que há de pior no ser humano, são o pior do futebol. Sinceramente, numa torcida organizada encontra-se a escória da humanidade.
Com o falatório e a gritaria da vizinhança não havia local de paz dentro de minha própria casa. Tentava ler alguma coisa, mas logo perdia a concentração por causa dos gritos. Tentei dormir um pouco, mas não consegui pelo mesmo motivo. Mais que droga de domingo!
Minha filha convidou uma amiguinha para brincar em casa. As duas também faziam um barulho infernal. Quando não estavam andando de patinete, estavam cantando as músicas dos comerciais da TV. Elas assistiam ao Disney Channel. Muitas e muitas propagandas de brinquedos. Fiquei admirado ao vê-las cantando de cor as músicas dos comerciais. E minha mulher resolveu passar o dia em frente ao computador, impedindo que eu lesse ou escrevesse alguma coisa.
Lembrei-me que ontem, pesquisando no site da Livraria Cultura (recomendo), vi o livro do Schopenhauer, “O mundo como vontade e representação”. Este livro foi uma influência crucial para Nietzsche. É a obra-prima de Schopenhauer e dizem que é bem acessível. Acessível na leitura, porque no preço: R$ 90,00! Mas há uma maneira de ler o livro sem pagar, ele é disponibilizado no site da livraria para leitura on-line, sem possibilidade, lícita, de ser baixado. A leitura deste modo não é muito agradável, mas para quem não quer pagar ou não tem os 90 paus é uma opção.
Li um pedaço da introdução, o cara que traduziu é brasileiro formado pela USP. Ele diz que Schopenhauer é conhecido como o filósofo do pessimismo, pois este diz que o mundo é indiferente aos nossos destinos. Filosofia diametralmente contrária a de seu contemporâneo e conterrâneo Hegel. Para Hegel havia um propósito para o universo, uma finalidade para a história.
Lembrei-me que tinha um livrinho que havia lido a bastante tempo chamado “Schopenhauer em 90 minutos”. Peguei o livro da estante e comecei a reler. O São Paulo sagrava-se hexacampeão brasileiro eu lá estava com os olhos grudados no livrinho. Pode uma coisa trivial como a vitória de um campeonato de futebol ser mais importante do que conhecer o pensamento de uma das mentes mais brilhantes de todos os tempos? Acho que li o livro em uns 50 minutos.
A leitura era tão agradável que ignorei todo o barulho, as idéias penetrantes do filósofo alemão também significavam o oposto a todo esse clima de euforia dominical. Havia uma pequena biografia e excertos de seus textos. Uma personalidade ímpar, um velho rabugento que recomendava o ascetismo, mas que em sua vida pessoal não agia como pregava. Rico, comilão, conhecedor de figuras como Goethe e também um inimigo mortal do barulho, ficava irritadíssimo com ruídos. Nessa parte me identifiquei muito com ele.
Schopenhauer ressentia-se por seu livro maior não ter alcançado o sucesso como ele esperava e merecia. Certa vez, em relação à indiferença de seus contemporâneos à sua obra disse: “Deveria um músico sentir-se lisonjeado com o aplauso entusiasta da platéia, se soubesse que eram quase todos surdos?” Pois é Schopenhauer, estamos num mundo de surdos!
O jogo terminou e o São Paulo ganhou o campeonato brasileiro. Aí começaram os fogos de artifício, as buzinas dos carros, a gritaria infernal e aquela euforia estúpida dos finais de campeonato de futebol. O que Schopenhauer diria dos campeonatos de futebol?
O São Paulo certamente conquistou um campeonato importante para sua história e seus jogadores conquistaram mais fama e dinheiro. Os torcedores, efetivamente, nada ganharam. Talvez muitos tenham sido agredidos, bateram seus carros e alguns até tenham sido mortos.
A leitura do Schopenhauer me confirmou a indiferença do universo em relação a nós, e o monte de banalidades que temos que inventar para tornar essa vida absurda mais suportável.
Vou comprar o livro do Schopenhauer, preciso conhecer melhor esse pessimismo que me contagiou neste domingo de final de campeonato brasileiro de futebol.