O HOTEL ABANDONADO
Chegamos naquela cidadezinha por volta das sete da noite. Uma chuvinha miúda e persistente caía sem dar trégua.
Havíamos combinado com nossa anfitriã que estaríamos esperando seu resgate naquela hora em um posto de gasolina central do lugar, que também comportava um barzinho ao redor e uma pousada no sobrado que o compunha.
Era tempo de Páscoa e nossa programação tinha sido passar o feriado na fazenda que havia adquirido há poucos meses. Seu entusiasmo havia nos contagiado e aceitamos o convite para conhecê-la.
O único imprevisto era a chuva que não tinha dado descanso desde que entramos no estado de Minas.
A cidade estava cheia e nos sentamos para bebericar uma caneca de vinho e aguardar.
Tentamos fazer contato pelo telefone, mas o celular informava estar fora de área e no lugar ainda não havia sido instalada outra linha de comunicação. O jeito era esperar!
Estava frio, chovia e só queríamos chegar ao destino, tomar um bom banho quente e descansar da viagem!
O tempo passava e a hora combinada já ia longe. Não conseguíamos comunicação e ficamos sabendo que uma barreira havia obstruído o caminho que levava à fazenda. Entendemos que era melhor arrumar algum lugar para pernoitar, pois não iríamos conseguir chegar ao destino naquela noite.
Na pousada que estávamos não havia vaga!
Depois de rodarmos sem sucesso à procura de um pouso, conseguimos uma indicação de um hotel fazenda nas proximidades, onde segundo nos disseram, seria o único lugar provável de conseguirmos alguma coisa e para lá nos dirigimos.
O lugar era bonito! A casa era grande e erguia-se imponente sobre uma suave colina. Caiada de branco com janelas em azul, tinha um estilo colonial. Uma alameda florida, iluminada por antigos lampiões levava à recepção onde paramos em um amplo estacionamento.
Meu marido preferiu esperar no carro, cansado de tantas tentativas vãs, enquanto eu e minha filha seguimos até a recepção para ver se desta vez teríamos sorte!
O ambiente no interior era aconchegante. Uma música suave pairava no ar. Tudo era limpo e arrumado, mas não conseguimos detectar qualquer presença humana.
Depois de chamarmos por alguém, tocarmos a campainha e nada acontecer, resolvemos explorar o lugar, a princípio timidamente e depois sem nenhuma cerimônia. O hotel parecia abandonado...
Notamos o salão de refeições já preparado para o serviço de café da manhã. Uma linda sala de descanso ostentava um grande piano de cauda, sofás e poltronas em tecido xadrez e mesinhas de apoio com abajur aceso, dando ao ambiente um clima bastante receptivo. Três grandes portas com altas bandeiras permaneciam cerradas e notamos trancas pesadas apoiadas em suportes de ferro laterais.
Alguns degraus levavam aos quartos que se distribuíam em longo e largo corredor, também iluminado por lampiões de parede e oferecendo pesados bancos de madeira rústica na sua extensão.
Enquanto circulávamos pelas dependências silenciosas, falávamos alto e tentávamos chamar atenção de alguém. Batemos nas portas de vários quartos e escutamos do lado de fora, mas nenhum barulho nem ninguém nos ouviam.
Desci à recepção e resolvi apanhar algumas chaves que se encontravam penduradas no escaninho. Assim, entramos em vários quartos, notando que em cada cama limpa e bem arrumada havia um apanhado de flores do campo e um cartão de boas vindas.
Minha filha sugeriu que escolhêssemos um para ocupar e eu, já exausta, concordei.
Escrevi um bilhete ao responsável, explicando o acontecido e deixei espetado no lugar da chave que estaríamos usando e voltei ao carro para buscar nossa mochila e avisar meu marido que já estávamos instaladas.
Sua reação foi de espanto e discordância! Alertou-me sobre a invasão que estava fazendo e decidiu que não participaria da nossa decisão, preferindo o desconforto de dormir no carro. Lamentei, mas não mudei de idéia quanto a opção de tomar um bom banho e me deitar em uma cama limpa a confortável. Levei um cobertor para ele e voltei para o quarto que escolhera.
O aposento era amplo e possuía 2 grandes janelas de peitoril baixo.
Depois de um banho maravilhoso e de estarmos aquecidas em nossos pijamas de malha, abri uma das janelas e observei que a cidade podia ser vista ao longe. Havia gramados em volta e muita vegetação densa mais ao longe. A chuva havia dado trégua e alguns buracos nas nuvens mostravam o clarão da lua que timidamente tentava aparecer. No dia seguinte provavelmente o dia seria mais luminoso.
Estava lamentando a intransigência do meu marido em não estar conosco quando bateram à porta. Era ele que pensara melhor e tinha decidido se juntar a nós. Dormir no carro estava sendo muito desconfortável e ele não resistira por muito tempo.
E assim, abraçados e exaustos, dormimos o sono dos justos até as oito e meia do dia seguinte!
Como eu tinha previsto, o dia amanheceu com céu limpo e depois de arrumarmos nossas coisas descemos em busca de um café da manhã.
O hotel parecia outro agora!
Chegamos ao salão que tínhamos conhecido deserto na noite anterior e várias mesas já estavam ocupadas. As portas se abriam para um agradável varandão e um farto serviço de self service nos convidava a participar.
Um rapaz veio ao nosso encontro e nos recepcionou apresentando-se como dono do lugar e nosso conterrâneo. Muito simpático, disse ter encontrado meu bilhete e agradeceu pela iniciativa em termos nos acomodado, desculpando-se pela ausência de todos. Houve uma festa na cidade e eles tinham ido participar. Como o lugar era pequeno e todos se conheciam, não havia preocupação em deixar o negócio sozinho. Coisas do interior...
Escolheu um lugar com linda vista para nós e explicou que esperavam muitos hospedes para aquela manhã, estando todos os quartos reservados para esta ocasião, por isso não havíamos encontrado ninguém na véspera.
Depois de uma saborosa refeição da manhã, já estávamos acertando a conta quando o telefone tocou. Nossa amiga avisava que estava nos esperando no local combinado. A tal barreira a tinha deixado ilhada e impedido que avisasse ou nos resgatasse no dia anterior, mas agora estava tudo resolvido e a fazenda nos esperava.
Depois de nos despedirmos, partimos levando prospectos e convites amistosos para voltarmos em breve e seguimos para nosso encontro alegres e recuperados.
Aquela aventura tinha dado um novo sabor ao nosso feriado!
Coisas diferentes que a gente não esquece...