Lampião e os dromedários (Pequenas Crônicas nada Históricas I ou como seria, se tivesse sido)

Todos já ouviram falar de Virgulino Ferreira, personagem que dispensa apresentação. Personificação do terror espalhou agonia e morte e poucos conseguiram lhe opor resistência. O que ninguém sabe, porém, é a razão maior deste terror, dos motivos que levavam à paralisia total dos seus oponentes, que somente poucos segundos antes do tiro fatal, ou da navalhada certeira, recobravam a consciência. Esta, porém, não era suficiente para entender, sequer reter, muito menos reportar o que fora visto segundos antes.

Historiadores renomados, reunidos sobre achados recentemente desenterrados, conseguiram resolver este mistério do nosso sertão. Virgulino foi morto junto com alguns comparsas e sua sempre presente companheira e sua cabeça foi apresentada à imprensa. Naquela ocasião nada de extraordinário foi encontrado no local ou seus arredores. Era apenas o acampamento de um fugitivo, mais nada. Hoje sabemos, no entanto, que a História precisa ser reescrita. As escavações a que nos referimos, foram feitas em um raio de dois ou três dias de marcha do ponto do ataque final ao temível bando e lá foi encontrada uma ossada bastante diversa de todas as conhecidas até então como animal de montaria.

Cuidadosa e sigilosamente tratado, o achado foi removido para a Universidade Federal mais próxima, local em que foi limpo, fotografado, estudado e remontado. Pasmem, tratava-se de um dromedário. Consta que em 22 de janeiro de 1859 uma Comissão Científica de Exploração desembarcou em Fortaleza, trazendo consigo 14 dromedários mandados trazer da Argélia por nada menos que o próprio Imperador. Dentre os membros da Comissão, inclusive, encontrava-se o escritor e poeta maior Gonçalves Dias.

Mas, o que nos interessa realmente são os dromedários. Pois bem, segundo os registros até pouco tempo conhecidos, estes animais chegaram até a se reproduzir no propício clima nordestino, mas vieram a falecer por motivos não muito claros. O que só se veio à luz depois, foi que pouco antes do ataque de sarna, que consta ter dizimado os pobres animais, um casal deles acabou surrupiado na calada da noite, por nada menos que um avô do pequeno Virgulino.

Os animais cresceram, se reproduziram e se tornaram o grande segredo da família. Virgulino se criou junto deles e passou a dominar todos os truques destes exóticos animais. Sabia montá-los como ninguém. Tivesse ele tido a idéia de montar um circo ao invés de roubar, certamente a História do Brasil seria diferente. Mas o que nos importa é entender que ao avistar aquele vulto bradando uma carabina sobre a corcova de um dromedário, qualquer sertanejo temente a Deus acreditava estar vendo a personificação do demônio, nada mais. Nada mais natural, sob estas circunstâncias, que paralisado, não opusesse resistência alguma.

Ocirema Solrac
Enviado por Ocirema Solrac em 07/12/2008
Reeditado em 11/12/2008
Código do texto: T1323249
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