13 E VIVA O PORTUGUÊS!...

Fama de ser puritano, no ato de escrever, também não desejo para mim. De jeito nenhum. Como aquele bobão, semi-alfabetizado, que só esnobava puxando nas letras do latim. Sem dúvida, a esnobar mesmo, jogando fora citações romanas da lista de um manual muito antigo. Agora, aqui para nós: o tal bobão já fui eu, o próprio, quando recém-saído dos bancos do ginasial. Como eu era idiota, metido a escrever engrolado, igual a um Quevedo espanhol.

Mas, também, minha Nossa!... Enxovalhar o nosso combalido – combalido, não, agredido – idioma, conforme se plantou, lá no paredão da Emcetur, lado oeste, aí também é demais. É dose para jacaré do riacho Pajeú, onde quem brinca de casinha é dona poluição.

Agora vejam que lindezura literária os meus pobres óculos de sol tiveram o despautério de anotar, enquanto eu esperava meu importado automóvel de brasileiro fortalezense, um confortável lotação Aguanambi. Li, esfreguei os olhos e copiei: A CLASSE “ARTISTICA” ATUAL DO BRASIL, NÃO PASSAM, DE BURGUÊSES PARASÍTAS. Sem comentário. Por favor, leiam tudo como está e não corrijam este primor de panfleto literário. Nada inventei, aqui. A frase estava lá, na parada de ônibus, pela Gen. Sampaio.

Mãozinha “subversiva” – como diziam nos idos da censura de expressão do pensamento –, aquela mão que pichou no muro tamanho protesto. Primeiro, agrediu indiscriminadamente os laboriosos e queridos artistas que, sem favor algum, merecem o apreço de todos nós, os menos incivilizados. Ora, talvez o gajo que exarou, lá, aquele desplante, quisesse apenas se referir aos artistas leva-e-traz palacianos, aborígines, desta província, aqui. No entanto, o que fez? Generalizou, botou no atacado. Outra vez, aqui para nós: no Ceará, com exceção de um ou outro, há um balde cheio de artistas puxa-sacos, sobretudo os torcedores dos tucanos bicudos. Só não lhes digo os nomes para não contrariar o fã-clube.

Em segundo lugar, de novo mão “subversiva” (aqui, bem entendido, não na semântica da ditadura). Pois a mãozinha do coisa-ruim vilipendiou, ultrajou e derrubou do cavalo, juntos, o Camões, Machado e José de Alencar, num total de seis (sic) vezes. Isto sob o meu modesto entender. Vocês, que têm muita sabença do vernáculo, talvez até deem com mais escorregões ortográficos. Erros gramaticais? Nada disto. Apenas criatividade.

A criatividade é um corcel fogoso, que rumina, campeia, corre, galopa e voa, à solta, lá para além das paragens do infinito. Então, sim, acham, por aí, que tudo pode. Afinal, com tanta safra de poluição e deboches linguísticos, minha Nossa Senhora dos vernaculistas sem pé e sem cabeça, seria o caso de até se aplaudir o estorvo do “artista” que produziu tal obra-de-arte, no frontão do muro. Por isso, com o maior louvor à erudição, humildemente boto a boca no mundo, para rasgar meu sincero elogio. E viva, viva o português!...

Fort., 06/12/2008.

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 06/12/2008
Reeditado em 02/03/2010
Código do texto: T1322338
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