Desgoverno
A administração da implantação, da operação e manutenção do Metrô – Rio, bem como os seus contratos de financiamentos externos pertenceriam ao rol de justificativas para que a sociedade brasileira exigisse uma auditoria detalhada sobre o processo de endividamento externo.
Da dívida externa o Metrô-Rio representa, aproximadamente, cinco bilhões de dólares, enquanto o benefício oferecido à comunidade carioca, é o transporte da ridícula cifra de 250.000 passageiros/dia (Maio/90), contra o um milhão prometido nas placas espalhadas pela Cinelândia e Carioca, no período inicial das obras.
Além disso, existem outros exemplos como Angra I, II e III, Ferrovia Nacional do Aço, Transamazônica, sobre os quais a sociedade brasileira mereceria saber quais foram os reais benefícios trazidos à vida nossa de cada dia.
O tema sobre os benefícios decorrentes dos custos da nossa dívida externa é outra história. Do que realmente queremos tratar é a natureza do caráter da grande maioria dos políticos como administradores do patrimônio público. Para tanto, vamos tomar para exemplo o Metrô-Rio.
A administração da implantação do Metrô-Rio, em última instância, foi a negociação de contratos, bem como o controle e fiscalização de suas execuções. Essa administração contemplou prazos políticos, fechou os olhos para os aumentos de preços provocados por alterações de projetos, não estruturou um sistema de controle de medição dos serviços de obras, montagens e fornecimentos para não incomodar, ou melhor, para favorecer empreiteiros e fornecedores.
Assim, cumprindo os prazos políticos estabelecidos, conseguiu inaugurar um pequeno trecho da linha projetada e com uma série de estações e acessos por acabar. Mais que isso, começou a operar sem os sistemas: de controle automático; de detecção de incêndio; de exaustão de fumaça; de iluminação de emergência; e outras trágicas irregularidades.
Antecedendo a tudo isso, contratos de empréstimos ou financiamentos eram negociados com taxas de juros flutuantes, atingindo-se níveis de taxas invejadas por qualquer agiota de porta de empresa ou de órgão público.
Continuando a implantação, uma segunda administração, em vez de consolidar o que já havia sido feito, como não trouxesse dividendos políticos, investiu num outro tipo de sistema. Às pressas, no final dessa administração, foi inaugurado esse novo sistema. Essa trágica e cômica inauguração foi sucedida da queda das catenárias para alimentação de energia dos carros, paralisando os serviços.
Essa administração forneceu o primeiro grande exemplo de como a influência política e/ou partidária promove um processo arbitrário de administração de seus empregados, o que mais tarde resultaria em parte da dívida com causas trabalhistas perdidas.
Aproveitamos a oportunidade para refletir sobre: como a organização política de um estado não prevê um órgão que, ao tomar ciência desses indicadores de “desadministração” não cassa os direitos políticos e profissionais desses vândalos institucionais.
A administração seguinte, como o governo resolvera investir, praticamente, só em educação,“desadministrou” a manutenção por um processo conhecido como “canibalização” – destruir alguns carros para manter funcionando o resto da frota.
Essa administração foi responsável pela implementação da anarquia na administração de pessoal. Realizando promoções arbitrárias e remanejamento de pessoal sem quaisquer critérios engordou bastante o passivo trabalhista.
Entra outro governo e com ele outra administração. Esta se caracterizou por um processo de expansão, que acreditamos se julgado por crianças, seria considerado criminoso.
Foram abertas frentes para todos os lados: Cruz vermelha, Cardeal Arco – Verde, Álvaro Ramos, Estácio, General Osório e, nada, absolutamente nada foi concluído. Além disso, um processo de demissão sem qualquer suporte administrativo e jurídico, ou seja, arbitrário, implicou em expansão, não dos serviços, mas da dívida trabalhista.
Desse nosso exemplo, podemos concluir que o caráter dessas “desadministrações” não tem compromisso com a qualidade, manutenção e expansão dos serviços que presta ao público, bem como com o patrimônio das empresas prestadoras desses serviços. Ou seja, não tem compromisso em zelar, manter e conservar o patrimônio público.
Seria muito interessante que pudéssemos medir os prejuízos causados por esse processo de destruição do patrimônio público. Escutamos alguns dizerem que não devíamos pagar mais nada aos financiadores, pois com taxas tão elevadas vamos pagar uma dívida já paga. Outros estimam que, todos os desmandos, se pudessem ser convertidos em recursos daria para expandir o Metrô até a Pavuna. Outros afirmam que só com a dívida trabalhista daria para triplicar a frota de carros. De concreto: o custo do Metrô – Rio por km de linha foi um dos mais caros do mundo.
“S.O.S Metroviário.” é o grito em rimas de um dos carros canibalizados da frota que ludibriou a segurança e fugiu do pátio de estacionamento. Tropegamente se arrasta solitário e em passeata, da Central à Cinelândia. Nesse percurso, num misto de protesto e pedido de clemência a esse caráter da administração pública, pede socorro a todos aqueles que o utilizam e às instituições de representação política da sociedade, para que o mantenha vivo. Argumenta que se sente ameaçado de morte pelo “desgoverno”.
“S.O.S. Metroviário” poderia ser o grito de toda essa sociedade, descamisada, desprotegida, desempregada, que, em rimas pediria, imploraria para que fosse alterado o caráter da administração pública.
“S.O.S. Metroviário”
Assim como todos,
surgi de uma união,
mas sempre em mim a sensação
de que foi nas coxas minha geração.
Meu nascimento, alegria e festa,
muito discurso, muita promessa,
pela cidade, muita esperança,
chegou a vez do carioca,
com conforto e segurança,
andar bem mais depressa.
Apesar de abandonado,
meus dias são gratificados
pois, sempre por mim, os desejos
de muitos são realizados.
Desejo da criança, de no parque brincar;
desejo do jovem da namorada encontrar;
desejo do homem de ao trabalho chegar;
desejo da mulher do desejo matar.
O carioca, quero crer, por gratidão,
dos transportes, me fez o campeão,
apesar de tanto carinho assim,
e de minha jovem idade,
já estou chegando ao fim
e gritando pela cidade:
S.O.S, S.O.S, Carioca Usuário!
S.O.S, S.O.S Povo Solidário!
S.O.S., S.OS., trabalhador metroviário!
eu, o Metrô, estou morrendo.
Socorro! Socorro!
eu, o Metrô, estou morrendo;
socorro! socorro!
eu, o Metrô, estou morrendo.