O AMBIENTE FAZ O MEIO

Hoje meu filho tem prova de ciências na escola. Cursa a quarta série do ensino fundamental. Sentamos juntos para revisar o conteúdo: poluição do ar, água e solo; efeito estufa, aquecimento global, reciclagem, coleta seletiva de lixo, chuva ácida, preservação, sustentabilidade.

Há trinta anos, na mesma série e idade escolar eu estudava fauna e flora. O ambiente farto de recursos naturais. Em estudos sociais aprendíamos sobre a construção da rodovia Transamazônica: “compromisso com o futuro”; “uma luta de gigantes contra a selva”; “descerraram a cortina verde”; “grande é a selva, porém maior é o homem, é brasileiro decidido a encontrar o seu futuro”; “o projeto da Transamazônica obriga o antigo inferno verde a recuar, coloca postos avançados de civilização nos lugares mais remotos e torna o índio um espectador espantado, prestes a ser assimilado pela cultura dos que chegam para ficar”; “primeiro é preciso desbastar a mata com a derrubada dos gigantes da selva, cujos troncos as moto-serras cortam e cujas raízes profundas são extirpadas do chão, ao qual se agarram ferozmente, pelas escavadeiras, os tratores e os bulldozers”. Estas eram algumas das manchetes e notícias que se ouvia no rádio e se lia nas revistas e jornais da época.

A Transamazônica, com um traçado transversal, pretendia ligar a região Nordeste à região Norte do país. Era o objeto. A justificativa: a estrada seria a alternativa aos problemas sociais causados pelas secas sazonais que assolavam os nordestinos e também uma resposta a pouca densidade demográfica da região amazônica. Seria uma integração para segurança nacional e desenvolvimento econômico, o “milagre brasileiro”.

Sou de uma geração educada para explorar o ambiente, no propósito de desenvolver o meio econômico e social. A geração atual, educada para melhorar o meio, no intuito da preservação do ambiente. Resumindo: eu aprendi a explorar e destruir. Agora ensino meu filho preservar e construir. É o ressarcimento dos danos. A reparação da culpa. No caminho para a escola vamos conversando, enquanto ele toma uma água mineral na garrafa pet. Deixo-o na portaria com um beijo afetuoso. Observo-o de longe. Antes de entrar na sala, pára na porta e joga a garrafa na lixeira adequada instalada ao lado. No caminho de volta penso sobre tudo isso. Estou formando um ser consciente da responsabilidade de conservação da natureza. Um ser integrado ao meio, estimulado para a preservação, a sustentação do ambiente. É um compromisso social com a vida!

A memória retroage, volta à construção da Transamazônica: “inferno verde”; “o homem vence a natureza”. Não dá para deixar de lembrar que os Estados Unidos, muito antes desencadearam a marcha para o oeste. A União Soviética construiu a Transiberiana. A África colonizada, tudo permitia ao interesse estrangeiro. O objeto e justificativa eram os mesmos. Quando meu filho souber disso se indignará, dirá: que absurdo! O tempo, em poucos anos, provou que a natureza se sobrepõe ao homem. Ultrapassamos limites, abusamos do meio. O ambiente responde com a mesma moeda. Dá o troco. As leis naturais imperam sobre as leis dos homens, esta é a sentença, sem discussão do mérito e sem possibilidade de recorrer. Um acordo de paz é sábio para o restabelecimento do equilíbrio entre estas duas forças. A juventude brasileira vem dando provas comoventes do despertar dessa consciência ecológica. Inteligência, reflexão, cumplicidade, respeito e tolerância é base de qualquer casamento. Assim também é com o homem e o meio ambiente. Será que meus colegas de aula, daquela época, também estão refletindo sobre isso? Seus filhos estão sendo educados como o meu? Só a consciência de cada um é quem sabe.

No final da tarde pego meu garoto na porta da escola. De mãos dadas retornamos.

_ Como foi a prova?

_ Acertei tudo.