Match Point - O Filme que eu não vi.

 

  
Quando ouvi a chamada pela televisão pensei: Eu não posso deixar de assistir a esse filme. De acordo com as resenhas foi fortemente inspirado em Dostoievski e seu Crime e Castigo. O livro que me despertou para a literatura, mostrando que um bom texto vai muito além de contar uma história. Além disso, o próprio Woody o considera o seu melhor filme. E  mais, seria a primeira vez em que eu veria um filme em uma televisão de 42 polegadas. Só faltou a pipoca, mas como eu já tinha me fartado com pães de queijo, abri mão.

Enquanto a novela passava e eu esperava fui ler algumas resenhas na net. Gosto de ler resenhas e críticas de livros e filmes, não atrapalha em nada a minha emoção. Fiquei sabendo então algumas coisas sobre o filme e a minha empolgação era total.

 A História é uma fábula moral sobre a culpa e sobre o papel da sorte na construção de nossa vida. É preferível ter sorte a ser bom, é a reflexão de Chris, o protagonista, sobre a sua profissão: tenista. E o ponto decisivo se refere aquele momento em que a bola de tênis paira por um milésimo de segundo sobre a rede e ninguém sabe de que lado ela vai cair.

E aí eu passaria o filme inquieta imaginando qual seria a escolha decisiva desse Raskolnikov moderno. Mas não foi isso que aconteceu: fiquei sabendo da decisão de Chris antes de filme começar e pela primeira vez isso me incomodou. Vou ver um filme sem suspense, pensei. Mas assim vai ser bom também.

 Filme longo (124 minutos) é bom assistir deitada no sofá da sala e foi isso que fiz. Acomodei-me bem para ver o Ponto Final. Esse deveria ser o nome em português, mas não foi. Foi utilizado o nome em inglês mesmo o que também achei mais forte. O personagem protagonista começa o filme lendo o livro Crime e Castigo e mesmo que eu não soubesse antes desta ligação logo eu já teria percebido que ali ia ter coisa. Afinal a lembrança do anti-herói de Dostoievski está sempre presente na inquietude que me traz algumas certezas sobre a inexorabilidade da vida.

O filme é rodado na Inglaterra sendo o primeiro dos três que fez com Scarlett Johanson. O protagonista é amante de óperas.  E é graças a isso que podemos ouvir a beleza das árias de Verdi interpretada por Enrico Caruso, como me foi informado, porque embora goste não tenho grandes conhecimentos nessa área. Aliás, as árias não são minha área, mas gosto. Sei que o trocadilho foi infame mas todos nós temos a nossa cota de infâmia diária.Talvez não goste mais porque ouça pouco e ouvindo pouco conheço pouco.

E tudo ia bem em minha sala. Nenhum zumbido. Ventilador desligado, um certo friozinho afastado pelo edredom de algodão listado e bem surrado. Tudo muito claro e compreensível. Lá estava o lindo moço pobre em toda a sua dignidade cavando sutilmente um emprego e também sutilmente conquistando o coração da mocinha rica e sem graça.Ele até se oferece para pagar contas!... O moço ama o que aquela gente  ama: tênis, aquele joguinho chato de bola pra lá, bola pra cá, só se ouvindo o barulho da bola batendo na raquete, silêncio completo na platéia. Boas leituras, boas músicas, bons filmes (Foram até assistir o filme do Che que o Waltinho fez). Logo se acostuma aos vinhos finos e bons pratos. Mas quem não se acostuma com isso?E Londres, Londres é linda! Mas... foi bem no começo que o triângulo começou. Ou foi o quadrado?  A bela Scarlet, sensual como uma gata em teto de zinco quente é uma norte-americana aspirante a atriz. E é noiva do moço rico que é irmão da mocinha sem graça. E a sogra não gosta dela e em uma reunião familiar a provoca e ela sai correndo na chuva e nosso Raskolnikov corre atrás dela e ambos voltam molhados para casa, molhados e sujos de grama e barro. Foi aí que aconteceu: dormi.  No melhor da festa.Nem vi eles voltarem, só deduzi como voltaram. E só fiquei sabendo pra que lado a bola caiu porque li as resenhas. Quando acordei (será que acordei mesmo?) mal consegui desligar a TV e chegar até a cama. Sei que cheguei porque no dia seguinte estava em cima dela (da cama) enrolado no edredom e com gosto de pão de queijo na boca.