VOCÊ PEDE ESMOLAS?

Estava voltando de Goiás pela Rodovia BR-262, num trecho onde as FMs só executam música sertaneja; eu não sou lá grande apaixonado deste estilo musical, mas ao mudar o dial de meu rádio, chegou numa estação de uma cidade próxima a Luz - MG, onde aquele programa só tocava música de raiz. Eu acabei observando uma letra pra lá de interessante, que contava uma história triste, mas não era uma destas histórias comuns onde o marido flagrou a mulher com o motorista, ou em que a mulher sofre pelo seu amado que foi comprar um cigarro e sumiu; era uma história de uma família inteira que entrou em desgraça.

Alguém aparece e pergunta a um rapaz que pede esmola numa rua de uma cidade grande, o porquê de uma grande cicatriz que ele carrega em seu corpo; o rapaz inicia a narrativa, informando ao moço que aquela cicatriz aconteceu em decorrência das atitudes de seu pai. O moço pergunta mais uma vez se foi o pai dele quem desferiu algum golpe contra seu próprio filho e ele diz que não; foi alguém que invadiu a sua casa, em busca de seu pai, que havia penhorado a casa e tudo que nela havia, numa mesa de jogo. A pessoa entrou em casa a ponta pés, com uma faca na mão; seu pai, já lúcido, com outra faca, tentou defender a pequena posse da família, mas foi atingido no peito; ele, o pedinte, tentou defender seu pai aos 12 anos de idade, também recebeu uma facada e esta o deixou com aquela cicatriz. Ele informa que seu pai morreu e sua família teve que morar nas ruas a partir daquela data.

Contou também que nas ruas, ele, sua mãe e dois irmãos menores, passaram a ver traficantes trabalhando, meninos cheirando cola, garotinhas se prostituindo; ao invés de uma televisão, ele passou a assistir cenas do cotidiano violento das ruas; ao invés de uma cama simples e quente nas noites frias, passou a conviver com um pedaço de papelão; ao invés de ver sua mãe no fogão, a viu pedir esmolas para sustentá-los; ao invés de estudar, viu a si e a seus irmãos, unidos pela busca apenas da sobrevivência e nada mais.

Disse o garoto que viu sua família posta na rua à própria sobrevivência por cinco anos, até aquela data; que sua mãe, doente do coração, teve que trabalhar e pedir feita louca para poder dar-lhe o que comer, mas que numa noite fria e chuvosa, ela pediu-lhe o colo para colocar a cabeça; falou baixinho ao seu ouvido: - Filho, minha hora chegou. Estou morrendo; desta noite não passarei; quero que você tome conta de seus irmãos, pois é a única pessoa que eles têm a partir de agora. Abençoou os filhos e fechou os olhos.

Depois daquela noite, eles não tinham mais ninguém; sobrevivem como antes, pedindo nas ruas e tendo que ver as cenas mais horríveis; falou ao moço que Deus, com certeza, está cuidando de seus pais lá no céu e que mesmo em total desgraça, ele sabe que aquele mesmo Deus também olha por eles; que espera que um dia a sorte mude para ele e para seus irmãos, para que não tenham a mesma sorte que seus pais e tantos outros que eles já presenciaram morrer nas ruas.

A música termina sem um final feliz; o cantor, por mais que eu quisesse ouvir, ele não cantou um final glorioso, apenas encerra dizendo que o moço deu uma moeda ao garoto e saiu.

Assim como este garoto e esta história, que nem sei se é fictícia ou real, existem milhares de outras histórias tristes espalhadas por todo Brasil; de Norte a Sul, Leste a Oeste, milhares de crianças, jovens, velhos, pais e mães, estão na maior dificuldade; morando em condomínios chamados de VIADUTOS, bebendo água de esgoto, tendo papelões como seus colchões, comendo restos que vão aos lixões; sobrevivendo, sabe-se Deus como, abaixo do inimaginável, abaixo da linha da pobreza.

Por mais que alguns ainda digam que muitos destes pedintes não precisam, embora eu concorde com a retórica das explanações mais insensíveis, tenho que afirmar que NINGUÉM VAI A RUA PEDIR porque acha maravilhoso; pode sim, chegar um momento em que fica mais lucrativo pedir do que trabalhar, mas o início de tudo sempre está rotulado por trás de uma história triste e sensível; ninguém mora em favela porque acha poético, nem os traficantes se limitam aos morros.

Certo dia, comendo num restaurante lá de Goiás, faz pouco tempo isso, uma garotinha de menos de cinco anos chegou a minha mesa para me oferecer um bilhete de rifa; estava sozinha pelo visto e conseguiu uns 5 reais depois que eu dei-lhe 1 real sem querer o seu bilhete; fiquei pensando em minha filha de 4 anos, que jamais precisou; fiquei pensando de como ela reagiria caso precisasse de qualquer coisa sem que eu ou sua mãe lhe desse nas mãos; eu chorei naquele momento, confesso; da mesma forma que estou chorando agora.

Vejo político falarem de MAIS DISTRIBUIÇÃO DE RENDAS, para que mais pessoas tenham acesso às riquezas deste mundo; isso é balela! Ninguém que tenha um pouco mais do que a maioria pensa em dividi-lo com mais alguém; estamos sempre dizendo que, tem muita gente que tem mais do que nós e que são estes que deveriam dar e nos colocamos por trás de uma redoma blindada onde ninguém consegue nos atingir, onde ninguém consegue qualquer tipo de ajuda.

Eu não sou obrigado a dar nada do que eu sofri para conseguir comprar e pagar; são anos e anos de estudo, são anos e anos de muito trabalho, sofrimento, humilhações, preocupações para poder comprar todo este pouco que tenho; mas tenho que pensar sim, que tenho demais; eu tenho mais do que o suficiente para viver uma vida confortável; tenho TVs de LCD, dois carros, duas casas na mesma cidade, enfim, tenho isso e milhares de pessoas NÃO TÊM NADA, elas não têm nem o que comer; ela não tem a comida básica; eu falei comida!

Senhores e Senhoras; acabei de tomar uma decisão firme para meus próximos dias; não quero elogios ou seguidores; não sou político muito menos religioso, mas irei passar a olhar melhor pelas pessoas que precisam. Não darei meus carros, casas ou televisões, não seria isso que resolveria o problema do mundo, mas com certeza, irei reunir tudo que não costumo usar em casa como roupas, cobertores, toalhas; farei uma cesta básica por mês e ofertarei a alguém que esteja na rua pedindo esmola; é o mínimo que eu posso fazer...!

Se esta história, não a minha, a da música, de alguma forma toucou-lhe o coração, ajude também alguém, nem que saiba com algumas moedas; o seu coração irá lhe recompensar IMEDIATAMENTE, não tenha dúvida sobre isso!


Carlos Henrique Mascarenhas Pires
Meu site: www.irregular.com.br