Sobre o acervo de 
                       
Jorge Amado

    
A família de Jorge Amado - dizem que sem condição financeira para conservar intacto o acervo do saudoso escritor  baiano - leiloou parte desse acervo.
     Segundo a imprensa baiana, obras de arte de elevado valor e alto significado, ganhas ou compradas pelo autor de
Gabriela, foram adquiridas por arrematadores do Brasil e do estrangeiro.
     Circulam notícias confirmando a venda "de pinturas que reproduzem a imagem de Jorge Amado".
     E que, entre as telas negociadas estão Olympia do agreste, do pintor pernambucano Cícero Dias; um São Francisco, de Alfredo Volpi; Candomblé, de Djanira e A mãe de santo e suas filhas, de Carybé.
     Não sei quantas peças foram, de fato, levadas a leilão. Pelo que acabo de ler, mais de 500 ítens. Há uma outra versão que dá como leiloado 90 por cento do acervo.
     Ainda segundo um matutino local, a família Amado teria arrecadado aproximadamente R$7 milhões. Vá lá.

     O que direi diante de tudo isso? Que fiquei perplexo.
     Não sou baiano. Mas  meus cinqüenta e tantos anos de Salvador dão-me o direito de defender tudo o que for do  legítimo interesse da hospitaleira Bahia.
     E nem podia ser diferente: aqui casei com Ivone, uma baiana autêntica, e com ela tive dois filhos, Paulo Fernando e Adriano, ambos nascidos na terra do Senhor do Bonfim.
     Estou, por consegüinte, no dever irrenunciável de preservar  e lutar para que se preserve o patrimônio cultural da velha Bahia de todos os Santos, de todos os Orixás, e de intelectuais belíssimos. 
     O acervo deixado pelo escritor Jorge Amado é parte desse patrimônio.
    
     Ante a declarada impossibilidade da família Amado manter na Bahia, sem lhe tirar um só ítem, o acervo do autor de Tereza Batista, acho, que cabia ao Governo do estado ou à Prefeitura de Salvador, possivelmente em parceria com empresas privadas, assumir esse ônus.
     Mas, enquanto, de forma muitas vezes demagógica, se libera dinheiro público para ajudar esta e aquela entidade, esta ou aquela instituição, este ou aquele evento, sob o argumento de que o a autoridade estaria garantindo a sobrevivência da "cultura baiana", os filhos ilustres da Boa Terra, como Jorge Amado, ficam esquecidos.
      Aí está a Casa Jorge Amado, no coração do Pelourinho, resistindo, escapando, só Deus sabe como...
     É bom lembrar, que só não se mandou para fora da Bahia todo o acervo deixado pelo autor de Tiêta do agreste, porque o escritor João Ubaldo Ribeiro, a tempo, não silenciou a respeito.   
    João, meu querido amigo, desde os bons tempos de Universidade - Faculdade de Direito -lançou, brilhante como sempre, um grito de alerta.

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     Até nem queria, mas vou voltar ao assunto.
     Quando estive, recentemente, em Porto Alegre, peramulando pela Rua dos Andradas, dei com a Casa de Cultura Mario Quintana.
     Seus conterrâneos aproveitaram o antigo Hotel Majstic, imponente obra arquitetôninca, e fizeram dele o santuário da memória do seu amado poeta.
     Tudo sobre Quintana - seus livros, seus poemas, correspondências, obras de arte, suas fotografias, seu busto - no Majestic pode ser encontrado. 
      Há ainda salões para conferências, áreas de lazer, café, restaurante, biblioteca, etc., etc. E até uma reprodução do último quarto onde o poeta viveu.
      Todo esse espaço cultural foi organizado com a colaboração direta de Helena Quintana, sobrinha do autor de Sapato florido.
     Os gaúchos de várias gerações continuarão na companhia de Mario Quintana.

     ***  ***  ***

     Permitam-me dizer o seguinte: se os bainos não se ligarem, muito antes do que se pode imaginar, Jorge Amado passará a figurar na indesejável galeria dos ilustres desconhecidos; ou se preferirem, dos desconhecidos ilustres.
     Sua memória desaparecerá por causa do descaso do povo de sua terra. Terra que ele, nos seus inúmeros romances, levou aos quatro cantos do planeta.
     Até quem nunca abriu um romance, quando é perguntado sobre a Bahia, diz logo conhecer os livros de Jorge Amado; mesmo que por eles tenha passado a quilômetros de distância...

     Cadê a Casa de Cultura Castro Alves?
     Cadê a Casa de Cultura Ruy Barbosa?
                E por aí, vamos nós...
    



Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 23/11/2008
Reeditado em 28/12/2008
Código do texto: T1299115