O BEIJO DA MORTE

Em muitos momentos ouvimos falarem de morte, mas não como a que se segue.

Fui viajante, passeei por este país afora, visitei lugares inexplicáveis, procurando um pouco de sabe se Deus o que. Na Bahia acrescentei um pouco de pimenta e molho em minha vida, mas não foi qualquer pimenta, foi aquela vermelhinha, a pimenta malagueta, ai como ardeu. Você deve estar se perguntando do que é que essa louca está falando; ainda não entendeu? Estou me referindo a um amor que tive a alguns verões.

Na Bahia, mais precisamente no Elevador Lacerda, encontrei-me com um rapaz chamado Caetano. Taninho era seu apelido carinhoso na Bahia, cheio de axé, ratatá, muito sotaque e com um borogodó baiano que só ele conseguia ter... O cara era gente boa, aliás, boíssima. Tratei logo de fazê-lo meu guia, afinal ele conhecia muito melhor de que eu a Bahia. Sua aparência era arrumadinha, era o famoso feinho bem arrumado, andava sempre com aquele penteado desconsertado que os paulistas usam, perfumado como um jardim inteiro de jasmins, e com umas roupas muito jeitosas. Sua simpatia era sem limites, seus lábios produziam um sorrisinho de canto de boca languido, ele realmente sabia como conquistar com elegância, sem contar o quão galante era o menino.

O cabra era safado, mas cheio de ginga, logo veio se engraçando pro meu lado e eu que fiquei muito arretada com o seu jeitinho melindroso e parti pra graça também. Foi uma graça só. Chamei de romance ratatá, pois quando estávamos juntos não fazíamos outra coisa a não ser um puro ratatá paulista-abaianado, oxente meu.

Ao completarmos dois meses de ratatá, ele levou-me a uma das praias mais belas da Bahia em comemoração, tomamos água de coco no mesmo canudo, comemos acarajé e vatapá, ô delírio de verão. Andamos pela praia de mãos dadas até o sol cair sobre o mar melindroso e fazer aquele xuá danado na pousada sobre a água fria. Este foi o momento em que ouvimos um barulho muito mais estridente do que o pousar do sol em um entrelaço de olhares e beijos envolventes. Senti naquele momento Taninho se afastar de mim por um gosto de sangue e ferrugem que possuiu nosso doce paladar romântico. Caetano me olhou sem perspicácia alguma e se derramou na areia da praia. Senti um aperto no respirar e corri até a exaustão tomar conta de minhas pernas e me impedir de avançar, minhas lágrimas eram infinitas como as gotas salgadas do mar, cai em um barranco e chorei até dormir, e ao longe ainda podia ouvir Caetano a me enamorar, isso me embalava num sono de tristeza e dor.

Ao acordar corri de volta à praia, e o corpo de Caetano não estava mais lá. No jornal da banquinha velha e erudita via-se a pior notícia que meus olhos salpicados presenciava; Uma fotografia de turistas em frente ao corpo de Taninho estampava a primeira página. Era como se ele não estivesse ali, naquele momento deixava de existir a mais brilhante e forte de todas as estrelas, foi humilhada sua funesta e santa partida, consideraram-no um indigente vadio, ao qual não havia de ser. Choro ainda em debalde, por saudade e falta daquele olhar sacana, nossos corpos se completavam, nossas almas se entendiam, nossas vidas eram parte da mesma viagem, a viagem da perdição, de um amor abstrato e conservador, que me deliberava em risos sarcásticos e que me faziam vê-lo, Caetano como unicidade do meu ser.

Daiane Durães
Enviado por Daiane Durães em 17/11/2008
Código do texto: T1287391