Trabalhador
Todos os dias ele chegava bem cedo e assumia seu posto na mesma rua e na mesma esquina. Seu trabalho era estender as mãos e ficar à espera de uma ajuda. Uma moeda ou uma nota, talvez. Por menor e mais simples que fosse o óbolo, cada centavo tinha um valor incalculável para sua sobrevivência. Não faltava e nem perdia hora na luta pelo pão de cada dia. Um trabalhador verdadeiramente esforçado e digno de todas as honras e prêmios por fazer valer a dignidade e o direito à vida.
Todos os dias ele chegava bem cedo. Um ser humano especial que, ao se colocar em seu posto de trabalho acendia em cada rosto (que por ali passava) a luz do amor, quase sempre endurecido e petrificado ante os abusos da boa fé das pessoas. Portador de deficiência progressiva e irreversível, como gigante postava-se diante dos olhos do povo para dar seu grito de igualdade. Um grito real que rasgava o véu da indiferença e descortinava a hipocrisia do poder verborrágico.
Todos os dias ele chegava bem cedo e assumia seu posto na mesma rua e na mesma esquina. Sua presença era uma vitrine do descaso e da omissão dos cobradores de impostos que têm como único objetivo aumentar o faturamento e os índices de popularidade. Todos os dias ele chegava bem cedo para não nos deixar esquecer de que somos felizes e agraciados pela divina providência que nos presenteia diuturnamente com a força, a saúde e o privilégio da fé que movimenta e dá vida aos nossos sonhos.
Todos os dias ele chegava bem cedo e batia à porta de muitas consciências que passavam apressadas, cegas, surdas e mudas. Ele passou.