PEQUENOS OU GRANDES MOMENTOS DESPREZADOS ( Celismando-Mandinho)

PEQUENOS OU GRANDES MOMENTOS DESPREZADOS

( Celismando Sodré - Mandinho)

A vida passa pela gente numa rapidez incrível, quanto menos a gente espera, ela está a meio caminho andado e só vamos nos dar conta disto quando é tarde demais. Vivemos o tempo todo alimentando ambições, priorizando conquistas mundanas que depois percebemos que não tem aquele valor superestimado que imaginávamos. Quantas vezes um filho chega para nós e pede simplesmente um pouco do nosso tempo para uma brincadeira e não lhe damos qualquer atenção ou fingimos não vê-lo.

Quantas vezes deixamos de fazer um afago em nossos entes queridos porque precisamos ir para o trabalho, ou porque o nosso coração está endurecido para manifestações tão saudáveis como essas. Vivemos num mundo apressado. Numa engrenagem louca, onde todos precisam correr para ganhar mais dinheiro com o objetivo de comprar algo que está na última moda, ou simplesmente porque o seu vizinho tem e você precisa ter a qualquer custo.

As palavras mágicas martelam nossa mente; “Consumir...consumir...ter mais...ter mais...”. Às vezes, deixamos de estar com a família e com os poucos verdadeiros amigos, para fugir, ir a qualquer lugar que seja longe daqueles que realmente amamos, e tudo isso vai se acumulando numa espécie de baú da mente para ser cobrado no momento em que estivermos no final da caminhada, frágil e carente de amigos e dos nossos familiares.

Estamos prestes a não sentir verdadeiramente mais nada, como: Respirar o ar lentamente, sentir a pulsação do nosso coração, morder devagar uma fruta e sentir seu verdadeiro gosto, ouvir atentamente a melodia dos pássaros, olhar os detalhes variados das cores nas asas de uma borboleta, sentir o toque das mãos de quem gostamos. Parece que perdemos o rumo das coisas e é preciso correr, correr cada vez mais para fugir de tudo que fizemos de maléfico com nós mesmos e para com a natureza.

Há quanto tempo não abraçamos ou beijamos nossos familiares e amigos? Há quanto tempo não promovemos uma espécie de retiro espiritual para nos conectar com a natureza, sentindo-nos parte dela e admirando toda sua explosão de beleza e harmonia.

Um amigo meu sempre me diz que tem pessoa que vive pobre e morre rico, acumulando bens, e quando chega no final da vida, olha para um lado e para outro, faz aquele questionamento crucial: afinal... pra quê???

É por isso que este momento, registrado numa fotografia em que estou abraçado com meu filho me disperta uma emoçao e uma angústia muito grande. Essa aparentemente simples e banal foto tornou-se muito especial em minha vida, por ser um fragmento do passado que sempre me recordo. Quando vejo meu filho hoje com quinze anos de idade, já freqüentando a escola, comparando com a criaturinha indefesa da foto, analiso a passagem do tempo e penso em como ele interfere no desenvolvimento de um novo ser que é tão importante para mim.

É como se um filme em preto e branco passasse na parede da minha memória, mostrando os melhores momentos do que ocorreu entre nós, durante todos esses quase onze anos. E penso também em quantos outros momentos como este eu desperdicei, para fazer coisas que tenho certeza, não eram mais importantes do que esta: estar ao lado do meu filho na grama da praça, brincando despreocupadamente.

Olho os detalhes da imagem na foto e relembro daquele dia, o sol de fim de tarde batia forte, o jardim com a grama alta, descuidada, precisando ser aparada, a sombra fresca da árvore e a praça quase sem ninguém. Apenas eu enternecido com o meu primogênito, minha esposa que registrou o momento, momento simples, mas de um significado especial que será tanto quanto mais especial, a partir da própria passagem do tempo, que faz com que tudo sempre se transforme. Quem sabe um dia meu filho possa mostrar esta fotografia para o seu filho, e eles olharão juntos para esta imagem com outras percepções.

Infelizmente, só depois que constatamos, inexoravelmente, que o tempo passou e que não tem mais retorno, é que percebemos que aqueles projetos mirabolantes de ficar rico a qualquer custo, de ser famoso ou de construir aquela mansão, não eram os mais importantes. O essencial estava bem ali do nosso lado, tão simples e tão óbvio que a nossa cegueira materialista não deixou enxergar. E você fica a olhar para seu passado, pensando no sofrimento que deve ter causado a tantas pessoas que eram, e muitas vezes ainda são, tão importantes na sua vida e que você desprezou por coisas que agora você percebe que não tinha essencialmente valor nenhum.

MANDINHO
Enviado por MANDINHO em 15/11/2008
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