Vocação
Quando assisto uma entrevista com o cirurgião plástico, Ivo Pitanguy, tenho a mesma impressão. A de que ele é um cirurgião do corpo e da alma das pessoas. A de que ele capta as necessidades do espírito em primeiro lugar. É um reparador, mas, sobretudo, um esteta. Não é por acaso. A sensibilidade e a humildade que ele transmite são impressionantes.
A fala é pura poesia. Talvez por isso, consiga apreender o essencial nas pessoas que o procuram. As dores não ditas, muitas vezes, nem aparentes ao outro, apenas a quem as sentem. Mais ou menos como a dona-de-casa que ao receber elogios pela beleza e organização dos ambientes, esconde secretamente os pequenos defeitilhos que somente ela conhece.
Para os demais, passa imperceptível a desarmonia. Mas para quem sente a feiúra estampada, o complexo que o dilacera, o não conseguir olhar-se no espelho ou sentir-se confortável com o álbum de fotografias, é dolorido.
Lembro de uma amiga que sofria terrivelmente porque achava o ossinho do pulso muito acentuado. Ora, cá entre nós, será que alguém repara num ossinho tão insignificante? Acredito que ninguém. Somente ela.
Para mim a diferença entre ter talento e ter vocação é a seguinte. Alguém pode ter talento para cozinhar, mas a elaboração de pratos saborosos não é o que o arrepia. Já a vocação é o contrário. Parece que a pessoa nasceu para fazer uma determinada coisa. É um caso de amor natalício.
Sinto que Pitanguy faz da cirurgia plástica o poema de sua vida. O sucesso? É decorrência. Não poderia ser diferente.
08.10.08