DEPOIS DA MORTE

Nunca pensei que fosse morrer tão cedo! Pelos meus cálculos chegaria aos noventa, ou cem, tranquilamente. Acontece que aos sessenta a “marvada da foice” me pegou. Acidente de carro. Não é o que mais acontece hoje em dia?! Não pude me preparar como gostaria, mas enfim, passei para o lado de lá numa boa. Não sofri muito. Foi vapt-vupt. Quando me dei conta já voava como os anjinhos. Levei um susto! Pensei que subiria, imediatamente, para o céu. No entanto, isto não aconteceu. Parece que ficarei por aqui, neste planeta Terra, até me desapegar de vez.

Estou pasma! Estou participando de tudo desde que meus olhos se fecharam de vez. Meu velório foi o maior barato. Pude constatar como era querida! Tinha gente pra chuchu! Também nunca fui de brigar, falar mal dos outros, criar caso por qualquer motivo. Sempre fui amiga, de verdade, boa mãe, esposa. Nem se fala! Como papariquei meu marido e fui fiel (coisas raras nesses tempos). Ele sempre pode colocar chapéu; nunca lhe apareceram chifres. Meu Deus! Como chorou no meu velório! Abatido, triste, mas... como sempre, não perdeu de vista uma só mulher bonita. Eu, que já o conheço bem, não me aborreci.

Em toda nossa vida, jamais lhe passou despercebido uns peitos grandes e uma b.... maior. Fui me acostumando. Ultimamente, quando estava distraído, até lhe mostrava. Ficava feliz à beça e eu pensava: - “ Como é macho esse meu homem!” Comecei até a pensar, ali mesmo no velório, qual das amigas separada ou solteirona, ocuparia o meu lugar. Os filhos também estavam. Todos tristes, chorosos, mas... no fundo, bem no fundo, loucos para terminar o velório, enterro, pois cada um precisava cuidar da sua vida, da sua família. Fiquei feliz vendo-os ali com saúde, com a família, seguindo o ritmo normal da vida.

Só achei meu velório muito barulhento. As pessoas chegavam abatidas, tristes com o acontecido, mas aos poucos encontravam amigos, conhecidos e, logo se esqueciam de mim. Começavam a contar casos, piadas, a novela das seis, a das nove, o Renan, o Senado... Será que o Lula contínua? E a violência?! Nossa! E, por ai, vinham os mais tenebrosos casos. Enfim, o enterro. Só meu corpo - porque Eu, minha alma, pairava sobre todos. Estava louca, também, para sair daquele barulho, daquela parafernália. Pensei: - “O corpo vai para a terra”. Lembrei-me, então, da lenda da mandioca. Aquela indiazinha chamada Mani, em cujo túmulo nasceu uma planta com fortes raízes, a qual foi chamada de Mani oca = Casa da Mani. Pensei: - “Amo todas as flores, todavia gostaria que meu corpo fosse adubo para roseiras”. E depois, meu Deus?! O corpo foi para a terra e Eu? Meu Deus! Minha alma quando e para onde irá?

Maria Eneida
Enviado por Maria Eneida em 12/11/2008
Reeditado em 16/03/2009
Código do texto: T1278930
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