Vez em quando, vai um...


                                 
                     A morte, afinal de contas, 
                     ser boa, porque     
                     o defunto é o único que não chora.

                                        Nestor de Holanda


    Desde ontem à noitinha, botei na cabeça que devia escrever uma crônica com este titulo: "Vez em quando, vai um..."
     Poderia, também, lhe dar outro titulo. Digamos: "Vez em quando, morre um..."
     Achei, porém, que a crônica deveria receber um titulo mais leve:  ela fala, o tempo todo, em morte, apesar da minha reconhecida e proclamada tanatofobia.
     A morte, por mais que se queira dizer-lhe inevitável,  é sempre indesejada. 
     Morrer é péssimo pra quem fica e não menos péssimo pra quem vai.
     Pra quem vai? Mas tudo não termina com a morte?  Os romanos diziam: Mors omnia solvit. 
      É? Sei não. 
     Ainda creio que o defunto não destrói, por exemplo, suas saudades... 
     Não quero que a morte me faça destruí-las... 
     Bobagem, né?
     Depois desse infrutífero e demorado papo, saiba o leitor, finalmente, o que me fez "tomar da pena" e escrever esta funérea página. Nada além do que um enterro ao qual compareci. Foi ontem ao meio-dia.
     Enterro! Um evento ao qual só me dou ao trabalho de comparecer quando o defunto é um parente ou um amigão. 
     Começo pelos velórios: detesto-os. 
     Não vou me alongar dizendo o porquê; já o fiz em outras ocasiões. E sempre lembrando esta oportuna observação do saudoso cronista pernambucano Nestor de Holanda: "Não gosto de enterro. Perde-se tempo no velório e o morto não liga pra gente."
     Enquanto Mario Quintana, com extrema ironia, escrevia: "Em todos os velórios há sempre uma senhora gorda que, em determinado momento, suspira e diz: Coitado! Descansou..."!
     Mas, como disse, há velórios, enterros, que são inevitáveis; como o que me levou, ontem, ao Jardim da Saudade, cá em Salvador.
     Morrera um amigão, meu colega de turma.
     Em dezembro de 1961, éramos sessenta e hum bacharelandos em Direito recebendo, sorridentes e esperançosos, o canudo, na Universidade Federal da Bahia. 
     Depois, cada um pegou o seu rumo.
     Agora, pelos meus cálculos, com o colega que acabo de enterrar, dez ou doze já partiram.
     Por isso, optei pelo titulo "Vez em quando, vai um..." 
     Até que todos estejam novamente juntos.  E ao som das liras do Além, recordemos os alegres momentos vividos nos corredores da gloriosa Faculdade de Direito da Bahia... 



     

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 11/11/2008
Reeditado em 10/12/2020
Código do texto: T1278118
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