Alucinações desventuradas

Havia um garoto e também uma avenida vazia, e, aos lados, as calçadas davam cena a grandes prédios. O céu estava branco como a neve e a cidade parecia inteiramente pálida. Não havia sinal de vida alguma pelos arredores, apenas uma grande névoa que o impedia de enxergar a grandes distâncias. O frio parecia ter invadido todo o lugar, e, devido a isso, das árvores as folhas haviam sido extirpadas.

O menino pôs-se a andar, estava de pijama e levava na mão um urso de pelúcia surrado. Prosseguiu andando lentamente e observando a monotonia da região. Não se escutava som algum exceto o do vento vagando pelas ruas desertas. Por entre o vão das cortinas que adornavam as janelas dos apartamentos podiam-se ver luzes semelhantes às de televisores ligados, o que deixava incerta a hipótese de total escassez de vida naquele lugar.

O garoto seguiu andando, e, à medida de cada passo seu, o frio ambiente parecia penetrar-se em seus músculos assim como o medo é capaz de fazê-lo.

Logo, chegara a uma praça num quadrado central que dava entrada a três outras ruas, uma em cada extremidade. Passou por seu interior pisando sobre as folhas secas, que ao serem quebradas pelos pequenos pés do garoto, realizavam os únicos sons do lugar. Fitou um chafariz logo a frente que dava ênfase a uma estátua de um anjo, cujos inimigos, pequenos e sombrios, entrelaçavam-se meio suas pernas. Ao terminar a travessia havia um homem na rua paralela à de sua origem. Atravessou o portão da pequena praça e dirigiu-se a ele chamando-o.

‘Moço’, ‘Moço’. Mas não houve reciprocidade.

O homem seguiu ali, estava de costas para o menino e numa posição um tanto curvada. Suas roupas eram brancas e estavam manchadas por algum material amarronzado.

O garoto seguiu se aproximando e chamando-o. Logrou. Ao colocar a mão sobre o ombro do desconhecido o homem virou-se num reflexo só. Possuía dois olhos totalmente brancos. Brancos como o céu daquele dia. Suas feições eram distorcidas e insanas.

Dando um salto para trás o menino pôde sentir suas costas perderem movimento ao bater num elemento sólido. Ao virar-se era mais um deles, mais um dos milhares que havia às costas deste outro. Milhões deles haviam tomado as ruas que há poucos minutos atrás se encontravam despovoadas. Avançaram sobre o menino aos urros. Um mar de insanidade o engoliu e abafou seus gritos.

Sua mão foi a que mais resistiu, ainda segurava o ursinho, que numa fração de segundo, afundou meio às criaturas; indo de encontro a seu dono.