O Sim e o Porquê Não

Ah vida triste... Ter de levantar todo dia cedo, com o galo ainda dormindo, o despertador o qual ainda nem mesmo despertou; o dia apontando com o raiar do sol, e eu; levantando...

Ah vida triste... São quatro e meia da manhã, e já estou de pé, meio correndo meio tomando café para pegar o ônibus. Ou como chamam por aqui, o famigerado Buzú.

Como sempre, ele está lotado, cheio de gente; uns com mau cheiro, outros nem tanto; vários dormindo – estes tiveram de sair mais cedo do que eu para poderem ir sentados – uns tantos conversando. Em verdade, a suma maioria colocando a conversa em dia, virando a cabeça, gesticulando, algumas vezes até gritando.

E cá, não do canto do ônibus, mas talvez em um dos piores lugares estou eu, o meio.

Aqui o mundo começa e termina. Ou termina e acaba. Não gostaria de dissertar muito sobre o assunto, entretanto, como uma senhora meio avantajada precisa passar, vou me dar ao trabalho de falar um pouco. Aqui, você vem quando não tem mais nenhum lugar para se ir; é tal qual uma invasão. Afinal de contas sua família cresce e você tem de ir para algum lugar. E tantos outros também têm, por conta da prole intensamente numerosa. Então você fica. Observa a movimentação, as pessoas, e de sentimento um tanto quanto ansioso, espera que ou a situação melhore e você consiga sair para outro lugar, ou que ao menos, o poder público tome uma providencia, tanto para o bem, como para o mal – Entende-se, dando-nos a nossa escritura, ou chutando-nos de lá com um belo pé na bunda. Enfim, estamos em um ônibus, aqui a escritura é desnecessária, então ficamos eu e outro o qual chegou primeiro, no meio, esperando unidos na força de nosso pensamento que ou o Buzú chegue no nosso ponto, ou alguma senhora com certas protuberâncias indesejáveis, não entre. Nada contra os gordos – posto meu pai era um, e se me permite, um muito do um! – é que a vida tem um tom ainda mais triste quando um gordo vem para o meio. Às vezes me pego pensando se devia levar todo santo dia uma lata de óleo, ou manteiga, ou de azeite...

-Dá para eu passar? Não que não dê, posto que coração de mãe tem de todos os tamanhos, do G até ao Super ultra mega G, é que está apertado por demais. Sem contar o cobrador olhando para mim, por conta de eu ainda não ter pago, sem nem mesmo falar do meu ponto que fica ainda muito distante, Vai ou não vai, se não tenho escolha...

Deixei-o ir, talvez pelo seu tamanho descomunal, sua feição de pé-Grande, os seus gestos ferozes e desengonçados, munidos a tudo isto, uma mão cerrada. Também o pobre querendo chegar no seu destino... No fundo fiz por bondade. Entretanto, queria eu ter tido essa chance quando meu ponto passou e eu não vi por está pensando alto, não digo falando, todavia pensando mesmo, com os olhos meio perdidos, meio em sincronia com o ir e vir, do parar e acelerar do motorista...

-Meu ponto! Corre, corre, corre. Sai da frente, Um belas pernas, Me larga, Eu nem peguei em você, Uma gorda, duas gordas, um, Hei motorista, você pode parar para eu descer aqui?

-Ah amigo, num dá não.

-Como assim, me deixe aqui!

-Se eu parar o povo me esfola. E você bem sabe como andam os esfolamentos quais os povos fazem... Sem contar os linchamentos, apedrejamentos...

-Segue motor, não para não!

Ah vida triste...